
Quando revejo minhas fotos de viagem, dá vontade de reprisar a experiência, estar lá de novo – mas não estou. Talvez volte um dia, quem sabe?
Ao rever fotos das minhas filhas quando tinham nove e quatro anos, a mesma coisa: duas doçuras sob meu constante cuidado, ainda não me questionavam, eram só abraços sem críticas e infinitas gargalhadas, que talvez se repitam quando eu estiver velhinha e elas menos implacáveis. Será?
Passado e futuro costumam ser apreciados a distância. Confortam, mas não provocam o impacto que este exato instante me entrega. Perplexa, mesmo, estou agora.
Não me perco no que foi e virá. Aqui é onde estou inteira, sem me fragmentar. É do que faço e sinto – neste átimo – que extraio o melhor do tempo.
Se hoje é quinta-feira, então é quinta, e não o último sábado nem a próxima segunda. Se chove, é chuva que cai, aguaceiro necessário para o plantio ou violento para quem está na rua, mas nada há que se enfrentar senão a chuva. Se é manhã, não é outra coisa: dez horas e trinta e dois minutos, nem antes, nem depois.
O beijo de ontem deixa um gosto mais na memória do que na boca.
O beijo que virá ainda é uma ilusão. Se estou beijando, beijo. Não fico pensando na solidão da qual escapei ou em um compromisso que talvez se estabeleça. Me dedico àquele beijo único.
A vida é sempre súbita, daí seu valor e encanto. Mesmo diante de um súbito silêncio, uma súbita perda, um súbito nada, é neste vão que se calhou de estar. Se tentarmos fugir, levaremos pendurada a dor não vivenciada.
Não me preocupo com o fim do mundo. É uma previsão que nunca se cumpre.
Cada minuto contém sua eternidade. Cada olhar é uma inauguração. O presente é sempre pontual, nunca se atrasa nem se demora. É onde estão as coisas verdadeiramente ditas e sentidas, sem o acompanhamento de relatórios, interpretações, post scriptum.
Será que vai ter vaga para estacionar? Será que falei alguma bobagem? Perguntas que só servem para nos tontear.
Preservo lembranças, mas não moro lá atrás. Projeto futuros, mas não moro lá adiante. A ressaca depois de uma noitada forte ou o frio na barriga de véspera – ambos fazem parte do momento presente, sensações providenciadas pelo ontem e pelo amanhã, intensificando o que temos em mãos agora.
Sentada no sofá da sala, é onde me acomodo. Se entro no banheiro, esqueço onde fica a cozinha. Em trânsito, durante um voo, aterrisso dentro de mim. Aprendi a me transformar num lugar seguro.
O desejo é vital, desde que não nos disperse. Talvez nunca mais a vida seja tão boa quanto foi, quem sabe dias melhores virão, mas confio que a intensidade da vida não está vagando por onde não estou.