Fortes emoções agitam a reta final de Liberdade, liberdade, novela das 23h da Globo. Mas, para Ricardo Pereira, não é só a luta dos conspiradores de Vila Rica pela independência do Brasil que interfere no desfecho do rude coronel Tolentino. Na verdade, essa é a menor das questões do personagem, que começou a trama como um dos maiores defensores da coroa portuguesa. A maior dúvida em relação ao fim do militar é como se resolverá a acusação de sodomia sofrida por André (Caio Blat), com quem Tolentino vive uma paixão avassaladora, mas expressamente proibida no Brasil de 1808.
Na terça-feira passada, Pereira e Blat protagonizaram a primeira cena de sexo entre homens da teledramaturgia global. Gravar cenas de uma relação entre Tolentino e André nunca foi problema para Ricardo. O ator, que é casado com a marchand Francisca Pinto desde 2010, não vê a menor diferença entre sequências de beijo ou mais quentes com uma mulher ou um homem.
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– Nunca foi uma questão. Quando beijo uma atriz é sem desejo. Faço profissionalmente, faz parte do meu trabalho. Então, tanto faz com quem é. A sensibilidade fora do comum do André desperta no Tolentino esse outro lado que, até então, ele não conhecia. Ou, sei lá, talvez até conhecesse, mas escondesse. Não é ficção: naquele período, uma relação assim era crime e a condenação era a morte. Não tenho ideia de como isso vai acabar – despista o ator.
Na história, Tolentino e André foram flagrados por Gironda (Hanna Romanazzi) justamente depois que o coronel prometeu tirá-la do bordel de Virgínia (Lília Cabral) e transformá-la em sua esposa. A jovem, com ciúme e preocupada com seu futuro, denunciou o crime, mas omitiu a participação do suposto futuro marido. E como André se recusa a revelar a identidade do amante, só a sua cabeça está em risco.
– André não se encantou pelo lado obscuro e agressivo do Tolentino. É o amor de um homem pelo outro, mesmo. A proposta de desenvolvimento da história entre os dois é discutir o preconceito, debater a intolerância. E isso terá um fechamento surpreendente – analisa o autor Mario Teixeira, que garante um desfecho inesperado para a trama.
Nos próximos capítulos, no entanto, Tolentino descobre quem acusou André de sodomia. E, durante uma conversa com Rubião (Mateus Solano), é instruído a procurar a testemunha e “eliminá-la”. Trabalho encarado com profissionalismo.
Afora toda a polêmica levantada pela cena de sexo entre homens, um detalhe faz com que Liberdade, liberdade ocupe um lugar especial em sua trajetória televisiva: essa é a primeira vez, depois de 12 anos conciliando a carreira de ator entre Portugal e Brasil, que Ricardo atua aqui com um sotaque integralmente lusitano.
– Achei isso extremamente interessante quando recebi o Tolentino. É um caminho bem diferente dos outros trabalhos de prosódia que eu costumo fazer para as novelas – justifica o ator, que nasceu em Lisboa e, ao contrário de seu personagem, já não guarda quase nenhum resquício do jeito de falar de Portugal.
Outro ponto que se tornou motivo de orgulho nesta novela foi a chance de interpretar praticamente dois personagens em um. O ator entrega que, para deixar clara a transformação que o envolvimento com André traria na vida do militar, gravou suas cenas anteriores ao encontro dos dois de uma maneira mais “seca”.
– Tolentino sempre foi muito a sombra do Rubião. No começo, era um cara meio vilão, que não sorria nunca. E a chegada do André mudou isso. Fez surgir outro Tolentino, bem oposto e que é capaz de sorrir. Não deixou de ser um durão, mas para o André ele se abre – explica.