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Baluarte da música de vanguarda brasileira, Mauricio Pereira esteve em Porto Alegre na semana passada. Falando sobre a nova cena musical brasileira (que muito deve a sua antiga banda, Os Mulheres Negras, aliás), disse ele que hoje a molecada prefere ser livre a ser gênio. Encontro conexão imediata com Ramiro enquanto ouço Caosmos, recém-lançado disco de estreia de sua banda, a Pássaro Vadio.
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Ramiro é gaúcho de Porto Alegre radicado em São Paulo há coisa de dois anos. Nasceu em lar de músicos, ouvindo o fino da música brasileira – Tom Jobim, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Baden Powell. Depois de vencer o circuito de bares e cafés da Capital, botou o pé no mundo e acabou em Sydney, onde se conectou com a onda de psicodelia reiniciada pelos australianos do Tame Impala.
Em 2015, montou a Pássaro Vadio com Jojô (baixo, guitarra e teclado) e Davi Neves (bateria e percussão) para burilar as músicas que havia composto durante seu exílio. O resultado é Caosmos, produzido por Alê Siqueira (Arnaldo Antunes, Elza Soares, Tom Zé) e que funde a sutileza da música popular brasileira com a libertinagem da psicodelia universal para questionar (talvez involuntariamente) o espírito do seu tempo.
Sua 10 faixas são o exemplo acabado desse imenso quebra-cabeças que se tornou a produção pop atual apontada por Mauricio Pereira, de jovens músicos que ignoram fronteiras para produzir música que desafia o senso comum. Um resumo deste zeitgeist está logo na abertura, em Saco Sem Fundo. "Como um saco sem fundo / juntando memórias / com o peito vazio, suando frio, tô sempre perdido na história".
Em Amargurado, deliciosa levada soul de cabaré, Ramiro continua a refletir sobre sua época – em especial quem orbita pelo ecossistema musical (quem faz, quem ouve, quem se debruça sobre). "Será que eu vou virar / um fóssil racional / que já perdeu a hora", pergunta. A resposta vem na sequência: "Eu tô virando um amargurado / já sei o que é bom pra mim".
Seria o suficiente para colocar Caosmos entre os grandes discos de 2017, mas há mais (bem mais) em suas 10 faixas. A previsão de lançamento é para o dia 2 de junho. Eu diria para você reservar um tempo nesse dia para uma audição completa. Vale a pena.
LANÇAMENTOS
LUZES
Fuss
Enganado. Foi assim que me senti quando terminei de ouvir esse segundo EP da Fuss. Depois de Rizoma, o primeiro trabalho, eu tinha dado por encerrado meu interesse por eles: eram os Arctic Monkeys de Porto Alegre. E estavam felizes com isso. Não havia razão para continuar dando ouvidos ao grupo. Mas então chegou Luzes, eu tinha tempo livre no almoço e... me senti muito enganado. Lucas Patrício, Lucas Tambosi, Eduardo Fraga e Heitor Rodrigues são muito mais ambiciosos do que eu imaginava.
Luzes mostra uma banda à vontade para explorar outras sonoridades, texturas e amplitudes sonoras – chegam a flertar com o épico, por assim dizer. Claro, indie rock ainda é sua pedra fundamental, mas o tesão e o sentimento que depositaram nestas faixas vai muito além do leite aguado que normalmente sai dessa vaca magra. Universo abre retumbante e lembrando o espírito de Rizoma, mas só até o final do primeiro minuto, porque aí vira outra coisa, visceral, complexa, atrevida, que segue pela faixa-título e sua ambientação nada iluminada. Chama mostra que a gurizada anda ouvindo coisa mais pesada, no casamento perfeito entre poesia existencialista e instrumental demolidor. Ah, destaque para o excelente trabalho de produção, que não desprezou nenhuma palhetada. Rock, Holiday Produtora, 4 faixas, disponível para audição nos serviços de streaming.