Alice é uma maravilha de menina. Ela tem seis anos e costuma invadir, sem aviso prévio, o último recanto de sobriedade de uma redação de jornal, que é a sala onde se escondem os sisudos editorialistas. Quando isso ocorre, nos dias em que ela sai da escola e vem buscar a mãe no trabalho (é filha da editora de Educação, Ângela Ravazzolo), suspendemos nossas atividades para dar-lhe atenção - até mesmo porque não nos resta alternativa. Ela é alegre, espontânea e carinhosa. Chega distribuindo abraços e beijos e logo se instala na frente de um computador. A geração digital não precisa de convite para abrir as janelas da tecnologia.
Outro dia resolvi entrevistar Alice:
- O que vais ser quando crescer?
- Estilista!
- O que faz uma estilista?
- Roupas chiques.
- É isso que estás estudando?
- Não. Estudo matemática.
- E como é o nome da tua professora?
- Maristela.
- Como ela é?
- Bem legal, graças a Deus.
- Tu acreditas em Deus?
- Acredito!
- E como ele é?
- Não sei. Sei que ele existe.
- Tu rezas pra ele?
- Rezo. Peço que minha mãe e meu pai sejam legais comigo. E eles são.
A lógica dos seis anos é incontestável. Antes de encerrar a entrevista, resolvi perguntar a Alice quando ela demonstraria para nós o que está aprendendo nas aulas de violino. Sua resposta veio com a espontaneidade fulminante que a caracteriza:
- Nunca!
Pois o dia de São Nunca chegou muito antes do que imaginávamos. Na última quarta-feira, movida sabe-se lá por que impulso, a pequenina apareceu na nossa sala com o estojo do seu instrumento na mão, pediu que eu fechasse a porta e deu um breve concerto. Executou Laranjada Doce, que é um acorde para iniciantes. Evidentemente, ficamos todos adocicados, como ocorre sempre depois de suas visitas. Foi aplaudida com entusiasmo.
Alice não sabe, mas a porta de nossa sala fica aberta porque sempre há a possibilidade de ela aparecer nos finais de tarde. E, embora não tenhamos coragem de confessar, também rezamos todas as noites.
Pedimos a Deus que ela continue sendo legal conosco.
Coluna
Nílson Souza: Laranjada doce
Na última quarta-feira, movida sabe-se lá por que impulso, a pequenina apareceu na nossa sala com o estojo do seu instrumento na mão, pediu que eu fechasse a porta e deu um breve concerto
Nílson Souza
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