Com dificuldade para resolver o conflito entre liberdade de expressão e direito à privacidade, o Brasil mantém uma tradição conservadora em relação a biografias não autorizadas - como no caso de Roberto Carlos.
As restrições vão na direção contrária de países como Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e Espanha, que liberam as publicações e orientam os descontentes a buscar reparação de eventuais transtornos na Justiça. Um exemplo recente da liberalidade da França foi o da biografia do ex-diretor geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn. Ele recorreu à Justiça para tentar censurar o livro escrito por uma ex-amante, mas não conseguiu. Os juízes determinaram apenas a inserção de um anexo dizendo que a obra atentava contra a vida privada de Strauss-Kahn e condenou a editora a pagar uma multa.
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Em um manifesto contra a censura de biografias não-autorizadas, um coletivo de 50 escritores, jornalistas e membros da Academia Brasileira de Letras afirma que o Brasil é a "única grande democracia na qual a publicação de biografias de personalidades públicas depende de prévia autorização do biografado". "Tal forma de manifestação encontra-se em risco, em virtude da proliferação da censura privada" critica o texto, assinado por nomes como Zuenir Ventura e Luis Fernando Verissimo.
Juristas divergem sobre a interpretação da lei. Um dos problemas, segundo a advogada especializada em direitos autorais Silvia Kyriakou, é que a Constituição estabelece ao mesmo tempo o direito à privacidade e à liberdade de expressão, sem definir qual seria superior. Para o advogado Hildebrando Pontes Neto, ex-presidente do Conselho Nacional de Direito Autoral, o direito do biografado deve prevalecer - conforme define o novo Código Civil, em vigor desde 2002 - alvo de um projeto de lei que tenta modificá-lo. Já o advogado Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), pensa diferente:
- A Constituição é clara no sentido de impedir a censura, sobretudo a prévia, e assegurar a liberdade de expressão. Se o biografado se sentir lesado, poderá, aí sim, acionar o Judiciário.
HISTÓRIA INTERROMPIDA
Casos de biografias barradas na Justiça
"Roberto Carlos em Detalhes"
Autor: Paulo Cesar de Araújo (Editora Planeta)
Quando: 2006
Para a Justiça, a obra invadiu a privacidade do músico
"Noel Rosa - Uma Biografia"
Autores: João Máximo e Carlos Didier (Editora Unb)
Quando: 1990
Para a Justiça, a obra invadiu a privacidade ao falar sobre o suicídio de parentes de Noel
"Sinfonia Minas Gerais: A Vida e a Literatura de João Guimarães Rosa"
Autor: Alaor Barbosa (Editora LGE)
Quando: 2007
Para a Justiça, a obra lesou direitos autorais
"Lampião - O Mata Sete"
Autor: Pedro de Morais (Editora do Autor)
Quando: 2011
Para a Justiça, a obra ofendeu a honra e a intimidade do biografado e de sua herdeira
Dois mundos
Restrição na publicação de biografias levanta conflito entre dois direitos
As restrições vão na direção contrária de países como Estados Unidos, França, Grã-Bretanha
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