Mais do que salvar o mundo de uma epidemia de medo, o guri de moletom verde e olhos esbugalhados, protagonista do filme Tito e os Pássaros, em cartaz nos cinemas de Porto Alegre desde 14 de fevereiro, vem se tornando um símbolo da ascensão recente – tanto em quantidade, quanto em qualidade – das animações brasileiras.
Num misto de Ensaio Sobre a Cegueira e Os Goonies com uma estética expressionista e trilha sonora tensa, o filme conta a história de Tito, um menino de 10 anos que vive apenas com a mãe, Rosa, desde que um acidente com um experimento do pai, o Dr. Rufus, o levou ao hospital. Quando a população passa a sofrer de um medo paralisante e contagiante (chamado no filme de “o surto”), em meio à avalanche de notícias alarmantes, ele precisa se unir aos amigos e ao pai, um estudioso de pássaros, para encontrar a cura.
O longa, produzido por Gustavo Steinberg, Gabriel Bitar e André Catoto, foi exibido em mais de 80 festivais ao redor do mundo, indicado ao prêmio Annie de melhor animação independente e entrou na lista de 25 animações pré-indicadas ao Oscar. Agora, é cobiçado por distribuidores estrangeiros, que veem na produção possibilidade de discussão sobre fake news e cultura do medo com crianças.
Tito e os Pássaros é a ponta final de uma trajetória do cinema de animação nacional, que surge amador, fruto de iniciativas individuais, se profissionaliza a partir da retomada do cinema brasileiro, em meados da década de 1990, e ascende nos últimos três anos – o marco é O Menino e o Mundo (2016), indicado ao Oscar daquele ano e pontapé inicial de uma cadeia de produção que rendeu 10 longas desde então, o que corresponde a quase 40% do total de animações feitas no país a partir de 1996, ano da retomada, de acordo com dados da Agência Nacional do Cinema (Ancine).
– Além de mostrar para o mundo a qualidade que conseguimos atingir artisticamente, O Menino e o Mundo levantou nossa moral no mundo e mesmo entre os realizadores nacionais – avalia Ana Flávia Marcheti, animadora e autora do livro Trajetória do Cinema de Animação no Brasil.
Lei da TV paga turbinou a produção de seriados
Se mesmo com incentivos financeiros do Estado é difícil fazer cinema de animação no Brasil – “Tito é o último de uma geração que conseguiu fazer milagre com pouco dinheiro”, chegou a dizer o produtor-executivo Daniel Greco durante a coletiva de lançamento do filme –, produções para a TV parecem ter encontrado uma maneira de prosperar (veja mais abaixo). Desenhos como Irmão do Jorel e Peixonauta são sucesso em canais de TV paga, em um movimento que tem a ver com a aprovação da lei que exige uma cota de produções nacionais em canais pagos.
José Maia, diretor de animação da Otto Desenhos Animados, que tem no portfólio o longa A Cidade dos Piratas, inspirado na obra de Laerte, e a série Rocky & Hudson, dos quadrinhos de Adão Iturrusgarai, em fase final de produção, ressalta a importância do incentivo e demonstra temor sobre o futuro:
– A lei ajuda muito, porque impulsiona, ajuda a mostrar a qualidade que existe e cria demanda. Temos trabalho programado para os próximos cinco anos, mas se não houver incentivo, não sabemos como vai ficar.
Veja lista de seriados animados
Anittinha
Criada pela cantora Anitta, produzida por Leila Naomi e Mariana Jaspe, a animação Clube da Anittinha é um apoio com a Birdo Studio. A série é exibida nos canais Gloob e Gloobinho e, apesar de ter sido pensada em 2016, foi somente em 2018 que teve sua primeira temporada exibida na TV fechada. A voz da personagem foi gravada pela própria Anitta, e o desenho foi criado pela cantora com o objetivo de contemplar seus fãs mais novos.
O Show da Luna!
Dirigida e criada por Célia Catunda e Kiko Mistrorigo, a série Show da Luna! foi exibida pela primeira vez no canal norte-americano NBC-Kids em agosto de 2014, mas foi em outubro que teve sua primeira exibição no Brasil, pelo canal Discovery Kids. A animação conta a história da amante de ciências Luna, que, aos seis anos, vê em tudo uma chance de aprender. De forma lúdica, a série diverte ao mesmo tempo que ensina e instiga as crianças.
X-Coração
Série gaúcha criada por Guto Bozzetti e Lisandro Santos, enfoca as aventuras de Alex, um jovem que trabalha de chapista em uma lanchonete de Porto Alegre enquanto sonha com uma carreira musical à frente da banda que formou com dois amigos, Zé e Sidnei. A série foi baseada em um curta metragem de mesmo nome produzido dentro do projeto Histórias Curtas, da RBS TV, e tem transmissão pela TV Brasil.
Irmão do Jorel
Com acidez e inteligência, Irmão do Jorel é uma animação atualmente exibida no Cartoon Network e Netflix. Com estreia em 2014, a série já foi renovada para a quarta temporada. Criada e dirigida por Juliano Enrico, a animação tem no elenco nomes como Daniel Furlan (do Choque de Cultura) e Raul Chequer. O desenho conta a história do menino conhecido como irmão do Jorel (o popular da escola) e que vive nas “sombras” do irmão.
* Colaborou Mariana Bavaresco