O leilão da tela Caipirinha, pintada em 1923 por Tarsila do Amaral, está ameaçado de embargo. O advogado Márcio Casado, que representa Carlos Eduardo Schahin, proprietário da obra desde 2012, alega que os bancos pediram a penhora do quadro para ressarcir as dívidas do pai de seu cliente, o empresário Salim Taufic Schahin. Em julho deste ano, a Justiça determinou que o quadro fosse leiloado.
Schahin pai, acionista de uma empresa petrolífera que faliu depois que a Petrobras começou a ser investigada por não apresentar balanços, comprou a obra nos anos 1990. Os problemas dele com os bancos começaram em 2014. As instituições financeiras foram atrás de seu patrimônio e descobriram a obra de Tarsila, solicitando a penhora do quadro, que já havia sido transferido para Carlos Eduardo.
O advogado dele, então, solicitou a um juiz do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) o embargo do leilão. A primeira vez que foi solicitada a suspensão foi há exatamente três meses, segundo o advogado. Quando o Tribunal acatou o pedido, os bancos recorreram a um juiz, que autorizou o leilão. O proprietário do quadro, Carlos Eduardo, perdeu em primeira instância e novamente em segunda instância.
Na semana passada, segundo o advogado, Carlos Eduardo entrou com outro recurso para que a propriedade de sua tela fosse reconhecida e não como propriedade de seu pai. O advogado afirmou que seu cliente já teria entrado com uma medida cautelar, não apresentada, ainda de acordo com ele, porque um sistema do judiciário estava suspenso na início desta semana.
Quando o advogado Márcio Casado começou a atender seu cliente, constatou que a avaliação do perito, de R$ 40 milhões, estaria abaixo do preço de mercado. Ele confirmou que vai pedir a suspensão do leilão e espera receber a resposta do STJ na segunda-feira (14) ou na terça-feira (15).
O leilão está marcado para quinta-feira (17). O lance inicial da tela é de R$ 47 milhões, o maior valor para qualquer obra de arte vendida no Brasil.
"O leilão não é irreversível. Na verdade, está tudo em aberto ainda. Eu sou o dono da obra desde 2012 e tive de entrar com o embargo de terceiro numa ação de bancos contra meu pai na pessoa física, iniciada após a recuperação judicial do Grupo Schahin em 2015", disse Carlos Eduardo.
Obra
Sob a guarda inicial de dona Olívia Guedes Penteado, primeira proprietária da tela e mecenas dos modernistas, a pintura foi herdada por sua filha, Carolina Penteado da Silva Teles. Registrada no catálogo raisonné de Tarsila do Amaral, era uma obra considerada pela artista uma de suas melhores pinturas do período modernista.
Ela, que, em 1923, estudava pintura com os cubistas em Paris, escreveu uma carta aos pais comunicando sua intenção de registrar num quadro suas lembranças de infância na fazenda. "Quero, na arte, ser a caipirinha de São Bernardo, brincando com bonecas no mato, como no último quadro que estou pintando".
Há poucas obras do período disponíveis no mercado e poucos colecionadores têm uma Tarsila de importância histórica comparável à tela pintada um ano após a Semana de Arte Moderna de 1922.
Nunca houve, no Brasil, uma tela que tenha alcançado o valor da pintura A Lua, de 1928, comprada no ano passado pelo Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), o que vai tornar o possível leilão de Caipirinha uma disputa entre colecionadores brasileiros e estrangeiros.
Segundo Jones Bergamin, da Bolsa de Arte, fiel depositário da obra, o MoMA, de Nova York, já mostrou interesse pela tela, que está disponível para visitação pública desde terça-feira (8), na Bolsa de Arte (Rua Rio Preto, 63), com lotação limitada a 10 pessoas por vez.
A escalada internacional dos preços de Tarsila começou em 1995, quando o empresário argentino Eduardo Costantini comprou a tela Abaporu, de 1928, por 1,3 milhão de dólares (aproximadamente 2,2 milhão de dólares em valores atuais). Em 2018, a tela A Lua foi vendida ao MoMA por aproximadamente 100 vezes mais.
Se o leilão do dia 17 for realizado, é provável que, a exemplo desses ícones que foram parar fora do Brasil, Caipirinha também siga o mesmo caminho.