A Revista do Globo de 22 de novembro de 1947, em alentada reportagem fotográfica sobre o lançamento de um filme, registra: “Realizou-se em Porto Alegre, em 27 de outubro de 1947, a premiere mundial de Olhai os Lírios do Campo, filme baseado no famoso romance de Erico Verissimo. Fato inédito entre nós, a premiere mundial trouxe a Porto Alegre Silvana Roth, estrela do cinema argentino que, no filme, desempenha o papel de Olívia”.
São diversas as versões cinematográficas da obra do maior escritor gaúcho, especialmente aquelas baseadas na trilogia O Tempo e o Vento, mas essa película de 1947 é hoje uma raridade e quase desconhecida.
Num ótimo artigo para um trabalho acadêmico, Márcio Soares dos Santos recupera a paixão de Erico pelo cinema resgatando as inúmeras referências que o escritor faz à sétima arte em sua autobiografia Solo de Clarineta. Segundo Márcio: “Aos sete anos, Verissimo já era frequentador assíduo do único cinema de sua cidade natal, Cruz Alta, interior do Rio Grande do Sul. A sala de projeção era administrada pelo senhor Lacombe.
O escritor conta esse episódio ao lembrar-se de que não pagava a entrada, porque o dono do cinema era amigo de sua família. Aos oito anos, ele ganhou um projetor no qual passava os filmes de celuloide, em que as figuras se moviam como as do ‘cinema de verdade’”.
O articulista também ressalta a técnica literária empregada em Olhai os Lírios, que se aproxima da linguagem adotada pelo cinema com a quebra da sequência cronológica ao fazer uso do recurso flashback. Essa obra se mantém como o livro mais vendido de Erico e foi o primeiro trabalho dele levado às salas de cinema. Dirigida por Ernesto Arancibia, sua adaptação levou o escritor a Buenos Aires para a leitura do roteiro de Tulio Demicheli e Mariano Perla.
Ainda conforme o artigo de Márcio, o romance nasceu quando Erico fez uma visita ao hospital onde um amigo havia sido internado: “O escritor encontrou naquele cenário um homem jovem saindo de um quarto com um bebê recém-nascido nos braços. Contaram a ele que a mãe havia morrido ao dar à luz a criança. De acordo com o autor, a história reverberava em sua cabeça, provocando ideias, imagens, como a do o hospital, a dos médicos, a da mulher que morre e do homem que fica, e que provavelmente a amava. Diante disso, o escritor descobre que estava no caminho de um romance. O universo de Olhai os Lírios do Campo estava definido”.
Fonte: artigo “Os filmes verbais de Erico Verissimo: uma abordagem cinematográfica e literária de Olhai os Lírios do Campo em Solo de Clarineta”, de Márcio Soares dos Santos