Quem entra no Mercado Público, em Porto Alegre, pelo portão do Largo Glênio Peres, logo à esquerda, encontra um tradicional estande com revistas e livros usados. Ali estará, para atender os fregueses interessados, Julio Cesar Francia Ferreira, 62 anos. Mas isso só até o final deste mês. Julio vai se aposentar e já vendeu o ponto. O comprador revelou que não pretende continuar no mesmo ramo de negócio. Portanto, o único e antigo sebo do mercado vai desaparecer. Uma pena!
Quem criou aquele local de comércio foi José Saturnino Correia Ferreira, pai do Julio, em 1966, quando o antigo entregador de jornais, nascido em Candiota, na Campanha, decidiu comprar a “permissão de uso” de um espaço dentro do Mercado. Num primeiro momento, inclusive, a localização era outra: ficava na entrada voltada para a Praça Parobé. Depois, com as modificações e reformas, a “banca” itinerou pela rua, mas acabou de volta ao interior do velho casarão. Aos 10 anos, Julio vinha de ônibus, de Canoas, para trazer a marmita com comida para Saturnino. Aproveitava para ficar por ali, dando uma mão e ajudando no atendimento. Sua mãe também atendia, especialmente depois que o titular se aposentou, mas o negócio acabou mesmo ficando nas mãos do filho.
Julio é de uma época em que crianças e adolescentes, logo após serem alfabetizados, cultivavam o hábito da leitura por meio das revistas em quadrinhos, chamados na época de gibis. José Saturnino morreu em 2008, mas sua banca de informação e cultura continuou prestando bons serviços à comunidade. É bom que se diga, que além de fornecer livros e revistas, o ponto da família sempre foi procurado, especialmente pelos visitantes, como um balcão informal de informações turísticas. Cartões-postais, com paisagens da cidade e do Estado, despertavam o interesse dos turistas que acabavam solicitando toda sorte de dicas sobre onde comer, aonde ir, como chegar a determinado local etc. Livros de conhecidos autores gaúchos, como os de Erico Verissimo, também sempre foram muito requisitados. Houve uma época em que ali também eram comercializados livros novos, mas, de um tempo para cá, o foco passou exclusivamente para os usados e para as revistas em quadrinhos, que vão desde a década de 1970 até os nossos dias.
Depois de 53 anos de atuação, ao encerrar suas atividades, o “sebo do mercado” ficará no passado, apenas na memória da população que o conheceu.
Colaborou Alfonso Abraham