É um engano pensar que uma viagem pelas vinícolas da serra gaúcha resume-se a provar os produtos elaborados na região – o que, por si só, já seria interessante. Para seguir no radar de turistas, marcas locais oferecem experiências que vão além da degustação de vinhos e espumantes reconhecidos dentro e fora do país.
A lista de atividades é vasta e serve para testar o paladar, a visão e o olfato. Engloba desde passeios guiados que detalham o processo de produção das bebidas até sessões de cinema ao ar livre. Também há possibilidade de fazer refeições nos restaurantes instalados dentro de propriedades ou de passar horas com família e amigos nos jardins de parte das empresas. Tudo isso rodeado pelos vinhedos que compõem a paisagem local.
Em cinco dias ensolarados, GaúchaZH visitou a Serra para acompanhar de perto o desenvolvimento do enoturismo. A viagem contemplou passeios por seis vinícolas, com unidades em cinco municípios – Alto Feliz, Bento Gonçalves, Flores da Cunha, Garibaldi e Pinto Bandeira.
Ao mesmo tempo que permite voltar ao passado e conhecer as raízes das empresas, a série de visitas também possibilita entender o atual cenário do setor vitivinícola. Hoje, o RS responde por cerca de 90% da produção no país, e a Serra é o principal polo.
Devido ao trabalho desempenhado na área turística, as empresas locais tornaram-se referência para novas iniciativas que buscam levar público à região. Um dos projetos recentes é de autoria de uma destilaria que fabrica uísque em pleno Vale dos Vinhedos. Desde julho, o local recebe interessados em saber como a bebida é produzida.
O roteiro a seguir faz um compilado das experiências vivenciadas em cada vinícola. Para participar das atividades, não é necessário ser um especialista em vinhos ou espumantes.
*O repórter viajou a convite da agência ConceitoCom Brasil
Cinema na vinícola
O turismo faz parte da reformulação de uma vinícola centenária de Garibaldi. Depois de amargar crise financeira, a Peterlongo busca resgatar o requinte de rótulos de outrora e investe em ações para atrair visitantes. Sediada em um imponente castelo construído com pedras basálticas, a vinícola faz questão de destacar aos turistas o fato de ser a responsável pelo primeiro champagne brasileiro – inclusive, uma decisão judicial garante à empresa a exclusividade no uso desse termo no país.
Na vinícola, além da opção de passeios guiados, sessões de cinema mensais também são oferecidas aos visitantes. Isso mesmo. Quando o tempo ajuda, a exibição dos filmes, batizada de Wine Movie, ocorre em um gramado ao lado do castelo – em caso de chuva, o evento é promovido na parte interna. Em frente ao telão, o público pode se acomodar em pallets com almofadas e cobertores.
— Desde 2015, quando fez cem anos, a vinícola está se reinventando. A parte dos passeios foi reestruturada. Temos todo o cuidado para manter a história viva — diz a enóloga Deise Tempass.
Em média, a produção da empresa é de 5 milhões de litros por ano – o carro-chefe é formado pelas linhas de filtrados doces e sucos. Quem visita a vinícola pode conhecer os processos de fabricação e as áreas em que as mercadorias ficam armazenadas.
Vinícola Peterlongo
Endereço: Rua Manoel Peterlongo Filho, 216, em Garibaldi
Visitas: diariamente, das 9h às 16h, com preço de R$ 30 por pessoa (inclui degustação).
Piquenique no jardim
Batizado de Wine Garden, um bar a céu aberto é uma das apostas turísticas da Miolo no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves. Como indica o nome em inglês, o espaço fica nos jardins da vinícola. Rodeado por árvores, conta com serviço de alimentação e venda de vinhos e espumantes. A intenção é oferecer um piquenique aos frequentadores. O Wine Garden funciona de quinta a domingo e em feriados.
— Recebemos a visita de famílias daqui da região e de diversos outros lugares. A ideia era montar um bar nesse estilo, e a Miolo aceitou a proposta. Fazemos eventos temáticos — conta Gabriela Jornada, sócia do bar, criado há quatro anos.
Além do Wine Garden, a Miolo também promove visitas ao interior da vinícola. Os passeios guiados apresentam a história da marca e permitem a degustação de rótulos elaborados no local.
Em 2019, a empresa completou 30 anos, e o aniversário foi celebrado em um jantar para convidados em 27 de setembro.
No Vale dos Vinhedos, a Miolo tem 100 hectares de vinhedos próprios. Além dessa propriedade, o grupo conta com outras duas na Campanha e uma no Vale do São Francisco (BA). Em média, produz 10 milhões de litros de vinhos finos e espumantes por ano. No mercado externo, está presente em 32 países.
Vinícola Miolo
Endereço: RS-444, km 21, no Vale dos Vinhedos, Bento Gonçalves
Visitas ocorrem diariamente. Grupos acima de 15 pessoas precisam de agendamento prévio. Informações sobre horários e valores estão disponíveis no site miolo.com.br. A entrada no Wine Garden é gratuita.
Mais perto da Capital
A localização é uma das apostas da Don Guerino para movimentar o enoturismo. Sediada em Alto Feliz, município de 3 mil habitantes, a vinícola fica a cerca 90 quilômetros de Porto Alegre. Ou seja, quem sai da Região Metropolitana pode visitar a empresa antes de seguir viagem a outras cidades da Serra, como Bento Gonçalves e Garibaldi.
A compra das terras do empreendimento ocorreu em 2000. O projeto foi finalizado sete anos depois, em 2007. Com 55 hectares de vinhedos, a propriedade fica em uma área com 450 metros de altitude. Do local, é possível observar o sol se esconder entre os morros com o passar do dia.
Por ano, a Don Guerino produz cerca de 500 mil garrafas de vinhos e espumantes. Os produtos são vendidos no Brasil e em outros sete países, incluindo Estados Unidos e nações europeias. Para detalhar como funciona a operação, a vinícola oferece visitas guiadas de segunda-feira a sábado. Além disso, um restaurante e um wine bar preenchem o cardápio de opções voltadas aos turistas. Ambos abrem as portas somente aos sábados.
Vinícola Don Guerino
Endereço: Rua Nova Alemanha, 909, em Alto Feliz
Visitas: de segunda-feira a sábado, com agendamento. Informações sobre horários e valores estão disponíveis no site donguerino.com.br.
Foco nos números
Localizada em Bento Gonçalves, a Aurora quer despertar a atenção de turistas para os números da marca. Fundada em 1931, a vinícola se apresenta como a maior do Brasil e abre as portas diariamente a visitantes. Passeios guiados permitem caminhar entre grandes tanques e pipas de vinho, conhecer a história local e saber detalhes da produção.
Por ser uma cooperativa, a Aurora mantém cerca de 1,1 mil famílias associadas, além de 500 funcionários. A exemplo da Peterlongo, também enfrentou crise em suas finanças. Passadas as dificuldades, a vinícola produz cerca de 52 milhões de litros de bebidas por ano, entre sucos, vinhos e espumantes. Com o acréscimo do que é comprado de terceiros, o número sobe para 65 milhões. No mercado externo, a marca está presente em cerca de 20 países.
– Não tem segredo. Uma vinícola precisa de boa gestão. Os melhores anos da Aurora foram os de crise econômica no país. Em 2019, as vendas devem subir mais de 6% – aponta o presidente da vinícola, Itacir Pedro Pozza.
A principal propriedade de cultivo de uvas da Aurora fica no município de Pinto Bandeira, ex-distrito de Bento Gonçalves. São 24 hectares de terras – 16 com vinhedos plantados – em uma área mais alta, onde é possível ouvir o canto dos pássaros e observar diferentes tons de verde por todos os lados. O local não é aberto a turistas.
Cooperativa Vinícola Aurora
Endereço: Rua Olavo Bilac, 500, em Bento Gonçalves
Visitas: há passeios gratuitos diariamente. Grupos acima de 10 pessoas precisam de agendamento prévio. Informações sobre horários estão disponíveis no site vinicolaaurora.com.br.
Contato com a natureza
A ampla área verde, com a presença de pavões, quero-queros e gansos, preenche a paisagem da Dal Pizzol, no distrito de Faria Lemos, em Bento Gonçalves. Ao reunir os atrativos naturais, a empresa deseja conquistar desde visitantes apaixonados pelo vinho até famílias com crianças em busca de entretenimento.
Fundada há 45 anos, a vinícola compra uvas de produtores parceiros para fabricação de seus rótulos. Mesmo assim, é possível avistar uma área de vinhedo na propriedade. E não é qualquer um. Batizado de Vinhedo do Mundo, reúne cerca de 400 variedades de uvas de 35 países, como Itália, Espanha e até Afeganistão. O que é cultivado serve para experimentos.
Outra atração da vinícola é o Ecomuseu da Cultura do Vinho. Com cerca de 200 garrafas, o acervo permite mergulho histórico no desenvolvimento do setor vitivinícola dentro e fora do país. Há, ainda, um restaurante, que abre para almoço aos sábados e domingos, e a Enoteca, localizada em um antigo forno de olaria. Nela, são guardadas relíquias produzidas pela vinícola, como um cabernet franc de 1978 – o mais antigo do local. Hoje, a Dal Pizzol elabora cerca de 250 mil garrafas de vinhos e espumantes por ano.
— Não exportamos. Mas temos vinhos espalhados por todo o Brasil. Tem gente que circula aqui pela região e começa o boca a boca. Aí, outras pessoas ficam sabendo, ligam e pedem nossos vinhos — diz Antônio Dal Pizzol, diretor da empresa.
Vinícola Dal Pizzol
Endereço: RS-431, km 5,3, no Distrito de Faria Lemos, Bento Gonçalves
Visitas: há passeios durante toda a semana. Grupos precisam agendar reservas. Informações sobre horários e valores estão disponíveis em dalpizzol.com.br.
Apelo à modernidade
Flores da Cunha abriga uma debutante na produção de vinhos e espumantes no Estado. Criada há 15 anos, a Luiz Argenta quer se destacar pela modernidade de seu empreendimento. Localizada no centro do município de 30 mil habitantes, a vinícola tem o telhado no formato de curvas, em referência às colinas de vinhedos que se espalham pela propriedade.
Dentro da construção, os vinhos são armazenados na cave ao som de Tom Jobim. Aliás, a referência a personalidades brasileiras não para por aí. Os vinhedos locais, que ocupam 55 hectares, são divididos em quadras, identificadas com placas que levam o nome de estrelas do país. Entre os homenageados, estão Chico Buarque, Santos Dumont e Elis Regina.
A estrutura da propriedade foi finalizada há 10 anos. Com 16 variedades de uvas em seus vinhedos, a Luiz Argenta tem produção de cerca de 180 mil garrafas por ano. Todos os rótulos são vendidos dentro do país.
Além de realizar visitas e degustações diárias, a vinícola também abriga eventos – entre eles casamentos – e promove uma atração chamada Cave Experience. Nessa atividade, os turistas são acompanhados por um enólogo e provam vinhos com uma venda tapando os olhos. A Luiz Argenta ainda dispõe de restaurante e wine bar.
Vinícola Luiz Argenta
Endereço: Avenida 25 de Julho, 700, em Flores da Cunha
Visitas: diariamente. A Cave Experience é realizada às sextas-feiras e aos sábados. Informações sobre horários, valores e agendamentos estão disponíveis no site luizargenta.com.br.
Ponto fora da curva
O uísque entrou na rota turística do Vale dos Vinhedos. Desde o início de julho, a Union Distillery, em Bento Gonçalves, abre as portas a visitantes que queiram conhecer o processo de fabricação da bebida, feita a partir de cevada maltada.
Uma das principais atrações do tour fica na parte final. Em um depósito com iluminação escassa, cerca de 10 mil barris de carvalho aguardam os turistas. Assim que a porta é aberta, é possível sentir o forte aroma exalado pela bebida que repousa no local. Em seguida, o passeio termina na loja da destilaria, com degustação de quatro rótulos.
— A ideia é oferecer um atrativo a mais ao turista no Vale dos Vinhedos. Queremos tornar o uísque ainda mais conhecido — relata o supervisor comercial da Union, Volnei Trintinaglia.
Fundada em 1948, a empresa iniciou suas atividades em Veranópolis, também na Serra. O desembarque no Vale dos Vinhedos ocorreu em 2015. Hoje, a destilaria tem capacidade de produção anual de 3 milhões de litros. Cerca de 70% dos rótulos fabricados são destinados ao mercado interno. O restante é exportado a países como o Japão.
Union Distillery
Endereço: BR-470, km 219,75, no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves
Visitas: de segunda-feira a sábado, com preço de R$ 40 por pessoa. Grupos precisam de agendamento prévio. Informações podem ser consultadas nos fones (54) 3452-5000 e (54) 98432-7123.