Famílias e instituições religiosas têm um desafio na Páscoa deste ano: celebrar a ressurreição de Cristo sem encontros religiosos e refeições entre amigos e parentes.
Igrejas e templos estão fechados ao público para tentar conter o avanço do coronavírus e a recomendação das autoridades é evitar viagens e ficar em casa, mas isso não será um empecilho para as celebrações.
Desde a semana passada, bispos, padres, pastores e rabinos levam mensagens de otimismo às comunidades gaúchas por meio de transmissões ao vivo nas redes sociais, sempre ressaltando a importância de manter a esperança no cenário atual. Que reflexões a Páscoa deste ano irá nos propor?
Dom Leomar Brustolin
Bispo auxiliar de Porto Alegre e coordenador do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Teologia da PUCRS
"A Páscoa é o tempo oportuno para revisar nosso modo de viver e interpretar a vida e o mundo. A fé pode não resolver tudo mas com certeza ressignifica toda experiência humana.
Ficar em casa, para cuidar de si e dos outros, é um gesto Pascal, que depende da consciência de pertença e valorização da vida. Rezar, meditar e fazer leituras espirituais é uma forma de superar o vazio de uma vida marcada pela lógica do desempenho. As crianças precisam ser educadas em contato com o transcendente. Talvez nem todos se sintam aptos, mas, gradualmente, é possível aprender que o essencial é invisível aos olhos."
Pe. Lucas Matheus Mendes
Pároco da Igreja Nossa Senhora das Dores
“É tempo de refazer caminhos, ressignificar a vida, deixarmos surpreender por Deus. Páscoa é isso, é refazer o caminho do perdão, indo ao encontro daqueles que fomos deixando para trás em função dos nossos egoísmos, das nossas vontades pessoais, em função da nossa falta de perdão.
É um tempo propício para você ligar para aquelas pessoas que por ventura magoaram você, ou que você magoou. Estamos percebendo neste tempo de pandemia que a vida vale muito mais que o nosso corre corre de todos os dias. Páscoa é tempo de nos deixarmos surpreender por Deus, por um Deus que acompanha, mas não um Deus que intervém a cada momento. Um Deus que permite a liberdade humana, que nos ama justamente porque nos faz livres. Tenho certeza, de que ao final desta pandemia, nós seremos muito melhores. Seremos muito mais humanos, e gostamos sim de estar uns com os outros. Os primeiros cristãos, ainda quando não existiam nossos templos, celebravam a páscoa em suas casas como Domus Ecclesiae (igreja na casa). Somos hoje chamados a permanecermos em nossas casas e deixarmos as comemorações para quando essa tempestade passar.”
Luís Fernando Batista Mesquita
Pastor da Assembleia de Deus de Porto Alegre
“Estamos vivendo uma pandemia, impossibilitados de estarmos juntos, em comunhão uns com os outros, de nos abraçarmos e de estarmos em família. Mas os cristãos levarão a mensagem da Páscoa, ressurreição de Cristo a todos que puderem, através dos canais digitais, das mídias sociais e de gestos de solidariedade.
A gente vê tanta coisa negativa, que são os fatos que estão ocorrendo no mundo, e isso às vezes carrega o coração de ansiedade e preocupação. Eu penso que temos que levar uma palavra de esperança, e essa palavra de esperança encontramos na pessoa de Cristo, no Evangelho.
A gente deve tirar uma lição de vida disso tudo, é tempo de rever valores, de valorizar a vida, as pessoas, de termos fé em Deus, de deixar Cristo ressuscitar o amor fraternal, gestos de solidariedade ao próximo, mas não com aquele intuito de competição, de quem faz mais, isto não é um jogo, poderemos nos frustrar. Temos que lembrar daquelas pessoas que não estão nas mídias e nas redes sociais. Há pessoas que não tem WhatsApp, e estão ‘vivas’. Lembre-se delas, uma palavra dizendo ‘me lembrei de ti’, isso tem um valor imenso. Nesta Páscoa espalharemos o ‘vírus’ do amor de Deus.”
Rabino Márcos Perelmutter
Comunidade Centro Israelita Portoalegrense
"A história de Pessach é a história de uma transição da escravidão para a liberdade, e a quarentena que estamos vivendo hoje, de algum forma, representa esta mesma situação, de estarmos oprimidos nas nossas casas. Estamos pensando quando será o dia que a gente vai poder sair para jantar com os amigos, fazer um churrasquinho, ir ao cinema, dar uma caminhada pela Orla acompanhado por amigos e um chimarrão.
São tantas coisas nos fazem dar conta do imenso valor que tinha tudo isso para nós antes. Ficar perto é a solução. A gente tem que ficar perto ao mesmo tempo que temos que ficar afastados. Temos que ficar longe da pessoa para não contagiar fisicamente, mas nada diz que não possamos ficar perto dos outros espiritualmente, que possamos aproveitar este tempo para nos conectar muito mais com o nosso ser, falar mais com nossas famílias, ter contato mais próximo com aqueles com quem compartilhamos o teto. As famílias todas trabalham, os filhos vão no colégio, e agora têm a oportunidade de estarem juntos. Esse ‘ficar perto’ também é uma espécie de benção que devemos aproveitar. Algo que nos ensina a história de Pessach é que devemos lutar para manter as almas livres das coisas que nos suprimem mesmo da opressão.
Tecnologia para celebrar em todo o Estado
Na noite de esta quinta-feira, o padre Fabiano Schwanck Colares rezou a Missa da Ceia do Senhor com a Igreja Nossa Senhora da Conceição completamente vazia. Ele conversou com os fiéis que o assistiam em casa, por meio do Facebook da paróquia. A cena do religioso no altar, diante de uma câmera de smartphone, se repetirá em outras comunidades católicas de Porto Alegre e do Estado de hoje até o Domingo de Páscoa.
Como ressalta Dom Adelar Baruffi, bispo da Diocese de Cruz Alta, os fiéis não podem ir à missa por conta das medidas de isolamento, mas a celebração chega às famílias. Além das redes sociais, pode-se acompanhar os eventos em rádios e em canais de televisão.
Até um drive-thru para se confessar foi organizado pela Diocese de Rio Grande. Nesta sexta-feira Santa, a Igreja Sagrada Família, na Praia do Cassino irá receber fiéis entre 8h e 12h: basta estacionar ao lado do confessionário e conversar com o padre da janela do carro.
As igrejas evangélicas também adotaram as celebrações online. Desde março, a Brasa Church ainda realiza lives diversas nas redes sociais e incentiva os encontros de grupos pequenos, uma tradição da igreja, por meio do aplicativo Zoom. Já a Vintage180 também realiza reuniões de sua confraria de homens pelo Instagram.
Para a comunidade judaica, a Páscoa tem um significado diferente em comparação às igrejas católicas e evangélicas. Eles comemoram Pessach, que celebra a libertação dos judeus da escravidão no Egito. As festividades serão mantidas, mas apenas entre familiares que dividem a mesma residência.
Como celebrar a Páscoa
- As celebrações das quatro arquidioceses e 14 dioceses de todo o Estado poderão ser acompanhadas pelas redes sociais de cada paróquia. Em Porto Alegre, o arcebispo metropolitano Dom Jaime Spengler transmitirá, na Catedral Metropolitana, a Celebração da Paixão do Senhor, hoje, às 15h; a Vigília Pascal, amanhã, às 19h; e a missa de Domingo de Páscoa, às 10h.
- Igrejas evangélicas do Estado também irão transmitir cultos via redes sociais. A Assembleia de Deus de Porto Alegre encontrará o público às 19h de domingo por meio do Facebook, do YouTube e do site adportoalegre.com.br.
- O Centro Israelita Porto-Alegrense forneceu, por meio de seu Facebook, músicas e rezas para serem feitas em casa. Hoje, às 19h30min, haverá a transmissão ao vivo de uma cerimônia. As celebrações serão encerradas com um bate-papo online sobre a série Nada Ortodoxa, no dia 16, às 20h, com o psiquiatra e psicanalista José Carlos Calich e a cineasta Flavia Seligman.