O quarto do Hotel Plaza onde Pedro Simon passou a noite de núpcias debruçava suas janelas sobre a Rua Senhor dos Passos, no centro de Porto Alegre. O então deputado estadual do MDB e sua noiva, Tânia, haviam chegado havia pouco da cerimônia na igreja. Lá fora, a Praça Otávio Rocha ardia em convulsão.
Era a noite de 28 de junho de 1968, e a cidade vivenciava um levante contra a ditadura, marcado por quebra-quebra e confronto entre manifestantes e polícia. Do quarto, Simon ouvia pedidos de socorro e testemunhava cenas de violência. Em dado momento, não se conteve. Resolveu se juntar à multidão. Tânia se postou diante da porta:
- Daqui de dentro, tu não sais!
- Mas estão morrendo ali - argumentou Simon.
- Sabe o que vão dizer se tu fores? Vão dizer que tu és tão de política, tão de política, que até abandonou tua mulher na noite de núpcias.
Quase meio século depois, o ex-governador, ex-ministro e ex-senador relata o desfecho do episódio:
- Não fui.
O Plaza era, quando Simon lá se hospedou, o hotel mais elegante e suntuoso da Capital. Inaugurado em 1958, tinha 152 amplos apartamentos, sete suítes, restaurante, bar e salão de eventos. Obras de arte e móveis de design refinado ornamentavam os andares.
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O ar-condicionado e o carrinho para levar malas importado da Europa eram considerados diferenciais inovadores. Empresários, políticos e celebridades hospedavam-se lá durante estadas em Porto Alegre. A sociedade local disputava o espaço para realizar festas. Era chique, mesmo para moradores da Capital, passar lá a noite de núpcias.
Rede Plaza interrompe serviços do Plazinha em reflexo ao momento econômico
- Era o grande hotel da cidade, o de mais classe. Todos tínhamos carinho pelo Plazinha - conta Simon.
Foi por causa desse passado glamouroso e das lembranças de momentos marcantes que o fechamento do estabelecimento, na semana passada, causou surpresa e consternação em muitos dos que o conheceram nos dias de glória.
Antes, tão bem-sucedido, que estimulou o mesmo grupo a fundar, em 1973, o Plaza São Rafael, outro marco da hotelaria gaúcha, o velho Plaza suspendeu as atividades assolado pela baixa ocupação. Segundo a empresa proprietária, a medida não é definitiva, e o espaço voltará a ser aberto, com um novo modelo de negócios.
Celia Ribeiro, colunista de ZH, costumava ir ao hotel para entrevistar artistas de passagem. Ela conta que o Plaza era importante ponto de encontro. No final da tarde, executivos e empresários reuniam-se no bar. Aos sábados, tornou-se famosa a feijoada do restaurante.
- Durante muitos anos, o Plazinha foi referência. Era top de linha - define.
Na interpretação de Celia e de outros observadores, o hotel foi, de certa forma, vítima do próprio sucesso. Ao mostrar que havia espaço em Porto Alegre para um hotel de classe, motivou a abertura do Plaza São Rafael.
O vizinho acabaria por ofuscá-lo.
- Com a inauguração do São Rafael, surgiu o nome Plazinha. Antes, era o Plaza. O diminutivo não deixava de ser pejorativo - diz Celia.
Espaço de camaradagem e arte
Outro político com lembranças calorosas do hotel é o ex-ministro da Educação Carlos Chiarelli. Eleito senador em 1982, ele passou a hospedar-se no estabelecimento durante suas vindas de Brasília. Costumava chegar na noite de quinta ou na manhã de sexta, para passar o fim de semana. O Plaza virou uma espécie de escritório, inclusive quando se tornou ministro, na década de 1990. Durante anos, recebia nos salões do hotel correligionários, deputados, prefeitos, líderes sindicais, empresários e jornalistas.
- Ali no Plaza nasceram muitas coisas. Era o interlocutor dos interesses de várias áreas do Estado. Às 23h30min, ainda estava recebendo gente no hotel. A equipe era fantástica, com um ambiente de camaradagem. As telefonistas faziam um pouco o trabalho de secretárias. O Plazinha faz parte da minha vida. A notícia do fechamento não me dá alegria - relata Chiarelli.
Um dos responsáveis pela elegância do hotel é o artista plástico Vitório Gheno, 90 anos. Na década de 1970, ele foi convidado a fazer a decoração do estabelecimento. Reformou o lobby, desenhou o restaurante, projetou móveis e espalhou obras de arte.
- O Plazinha é um hotel com arte. Tem obras em todas as unidades. Na minha opinião, é o esboço de um hotel-butique. O salão de estar tem objetos e obras de arte com mobiliário contemporâneo, moderno e clássico. Gosto muito de entrar no Plazinha. Agora tenho de conjugar no passado, porque, para minha tristeza, o Plazinha fechou - registrou Gheno, em texto enviado a ZH.
Primeiro hóspede é também considerado o cliente mais fiel
Também recebeu a notícia do fechamento com pesar o médico de Pelotas Paulo Crespo Ribeiro, 88 anos. Em 1945, quando veio estudar Medicina na Capital, ele instalou-se na Pensão Familiar Brasileira, que ficava na Senhor dos Passos. Mais tarde, o Plaza foi erguido no mesmo lugar. Habituado à vizinhança, Ribeiro passou a se hospedar lá.
Em um livro comemorativo, a Rede Plaza apresenta o médico como seu primeiro hóspede. Além de antigo, ele é um cliente fiel. Durante mais de meio século, hospedou-se lá. A última vez foi em março. Levava sempre uma santinha, que deixava na mesa de cabeceira. Quando a viam, os funcionários já sabiam que se tratava do "dr. Paulo" e caprichavam no atendimento.
- O Plazinha, para mim, era um carinho. Era a minha casa em Porto Alegre - afirma Ribeiro.