Bastam minutos de conversa com Alba Terezinha Visintainer Lopes, 93 anos, para perceber um dos elementos-chave de sua receita de vitalidade e longevidade: o bom humor. Aguardando o início da aula de canto na Ciclos+, no bairro Bela Vista, em Porto Alegre, ela comenta:
— Não tenho mais aquela voz de soprano que eu tinha. Agora é soprano rachada!
Professora de educação física aposentada que lecionou por 30 anos, Alba frequenta a escola com cursos voltados ao público acima de 60 anos uma vez por semana. Interessa-se por temas variados: literatura, psicologia, filosofia, história da arte. Cultiva ainda o hábito da leitura em horário peculiar: da meia-noite às 2h.
— Gosto de tudo. Agora estou lendo a história de Jesus — conta.
Alba mora sozinha na Zona Sul, conta com o auxílio de faxineira e cuidadora em alguns dias, tem quatro filhos, oito netos e 15 bisnetos. Mantém contato regular com os familiares por meio da “máquina infernal”, como define o celular. Almoça uma vez por mês no Clube dos Jangadeiros com as amigas. Recentemente, passou dois meses na casa de um neto no Espírito Santo. Alimenta-se bem e se exercita na academia do prédio duas vezes por semana, com personal trainer.
Como regra, evita o estresse, discussões inúteis, incomodação sem motivo.
— Precisa muita coisa para me incomodar. Por que vou me incomodar? Vou resolver? Não resolvo nada. Não reclamo da vida. Para que vou reclamar? Se não leva na cabeça hoje, leva amanhã. Não retruco. Se me incomoda, engulo. Palavras ditas não são esquecidas — diz a aposentada.
Questionada sobre um conselho para viver bem, Alba ensina:
— Tem que fechar a boca, achar que está tudo bem. Se não está bem hoje, vai estar amanhã. Tem que sorrir para não perder o amigo.
Para o médico geriatra Frederico Ludwig da Costa, do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), bom humor e leveza certamente contribuem para uma vida longeva. Alba opta por dar menos importância para as coisas que não consegue controlar e se preocupar mais com aquelas que é capaz de controlar, analisa o profissional.
— Esse modo de encarar a vida é muito ímpar, diferenciado. Ela parece ter um elemento muito importante que é propósito de vida, busca por desafios, bons hábitos, alto-astral — observa Costa, também professor da Escola de Medicina da instituição.
O especialista elenca outros pilares fundamentais para quem deseja somar muitas décadas de existência: alimentação balanceada, prática regular de exercícios, boas companhias, estímulo cognitivo, tratamento de comorbidades, gerenciamento de saúde mental, boa rotina de sono.
— Acredito muito que o envelhecimento saudável se conquista ao longo da vida. Com bons hábitos desde cedo, a gente monta os alicerces. É um trabalho constante. Não é fácil porque demanda muita disciplina e cuidado — afirma o geriatra. — Talvez a mensagem que essa senhora nos passa é a de que, na vida, ela buscou muita qualidade de vida e acabou conseguindo muita quantidade de vida — completa.
Priscila Abiko, geriatra dos hospitais Edmundo Vasconcelos e Albert Einstein, em São Paulo (SP), destaca a importância das relações na terceira idade. Relacionar-se bem com quem está ao redor tem reflexos em diversos aspectos de saúde.
— As interações fazem com que o idoso mantenha as suas funções e capacidades cognitivas. Ele usa a memória, a linguagem, a função executiva. Do ponto de vista da demência, o benefício é indiscutível. Do ponto de vista do humor, ter vínculos afetivos e interação de qualidade previne e trata os quadros depressivos — destaca Priscila.
A velhice é uma fase mais suscetível à depressão, ressalta a médica:
— É um quadro muito comum nos idosos. Essa faixa etária tem muitas perdas, de pessoas queridas, de capacidade cognitiva, de capacidade física. Tudo isso favorece e precipita mais os quadros de depressão.
Todos os cuidados com a saúde mental devem ser simultâneos com a atenção à saúde física.
— Em resumo, o básico é tratar as comorbidades. A pressão está controlada? O diabetes está controlado? Já abandonou o tabagismo? Seus exames estão em dia? Sem a saúde física, não consigo ir para o refinamento — orienta Priscila.
Para viver mais e melhor
- Reduza a quantidade de alimentos industrializados. Busque mais opções naturais. Inclua pelo menos duas porções diárias de proteína em suas refeições
- Na rotina de atividade física, inclua exercícios de força (musculação) e aeróbicos (caminhada, corrida, natação). Procure se manter sempre em movimento no dia a dia
- Tenha boas companhias. Mantenha relações saudáveis com familiares e amigos. Evite sempre o isolamento
- Procure passatempos de estímulo cognitivo, como leitura e jogos
- Mantenha comorbidades (diabetes, hipertensão, cardiopatias) sob acompanhamento e controle
- Questões de saúde mental precisam de atenção. Cuidado com sintomas de depressão e ansiedade. Gerenciar o estresse também é fundamental
- Previna-se. Faça os exames de rastreio solicitados pelo médico. É mais fácil tratar uma doença em fase inicial do que avançada
- Durma bem. Para melhorar a qualidade do repouso, reduza a luminosidade da casa ao entardecer e encerre o uso de telas pelo menos uma hora antes de deitar
- Desenvolva a espiritualidade
- Evite o consumo de álcool e cigarro