Acabou o tempo em que os americanos desconheciam o Brasil. Hoje, qualquer cidadão minimamente informado sabe que a nossa capital não é Buenos Aires e que São Paulo não fica na Ásia. É um baita progresso, se comparado ao nível endêmico de ignorância de décadas passadas.
É fácil apontar as causas da mudança: Olimpíada e Copa do Mundo. Os eventos, separados por apenas dois anos, abriram um espaço planetário de curiosidade e interesse pela marca Brasil.
Falem o que quiserem, mas, do ponto de vista da projeção de uma imagem positiva, ambos foram extremamente eficientes. Basta lembrar-se de 2014, quando os EUA pararam para assistir à derrota da sua seleção contra a Bélgica, em Salvador. A foto de Barack Obama em frente à tevê correu o mundo. Ou dos recordes de Michael Phelps no Rio. Um ano depois, a solução virou problema. Culpa nossa. Exclusivamente nossa.
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O valor de uma notícia no The New York Times é incalculável. Tanto que, a exemplo de todos os jornais sérios do mundo, o NYT não vende notícias. Estamos lá, pelo menos duas vezes por semana.
Graças à Olimpíada e à Copa do Mundo, criamos uma demanda que não existia. Uma área gigantesca para projetar a imagem daquele país diverso, que tem samba, praia, sol, frio, chimarrão e vatapá. Que tem indústria, agronegócio e vocação para o crescimento.
Um país de gente acolhedora, que soube organizar dois eventos impecáveis do ponto de vista da percepção externa.
E então, quando o espaço finalmente estava aberto, quando americanos, asiáticos e europeus descobriram que existe um país legal chamado Brasil, esse país só tem a oferecer manchetes sobre corrupção, desmandos e conflitos políticos. É isso que a mídia publica aqui, com algumas exceções.
A notícia mais recente sobre o Brasil que li no The New York Times durante a semana discorria sobre as suspeitas de corrupção envolvendo Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro. Meia página. Com foto.
Depois de passar muito tempo pedindo por favor, lembrem-se de nós, hoje acordo pela manhã, pego o jornal na porta de casa, abro o computador e torço para que tenham nos esquecido.
O que me salva é gente como a minha vizinha Sara, uma americana de uns 80 anos, cabelos branquinhos, que adora Caetano Veloso e que outro dia veio me pedir indicações de autores brasileiros, porque ela "só tinha lido Clarice Lispector e Jorge Amado".
Comprei pela Amazon uma tradução de O Centauro no Jardim (The Centaur in the Garden) –, do Scliar, e dei de presente para ela, cheio de um orgulho que nenhuma manchete ruim conseguiria apagar.