
Stephen King é uma fonte inesgotável para o cinema, a TV e o streaming. Só Shakespeare já foi mais adaptado do que o escritor estadunidense de 77 anos. Neste momento, estão em andamento pelo menos 20 projetos de longas-metragens, curtas ou séries, que vão se somar aos mais de 350 já lançados, incluindo Carrie, a Estranha (1977), O Iluminado (1980), A Hora da Zona Morta (1983), Conta Comigo (1986), Louca Obsessão (1990), Um Sonho de Liberdade (1994), O Nevoeiro (2007) e It: A Coisa (2017). O filme mais recente é O Macaco (The Monkey, 2025), baseado em conto publicado em 1980 e em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira (6).
Quem assina o roteiro e a direção é Osgood Perkins, 51 anos, o filho mais velho do ator Anthony Perkins (1932-1992), imortalizado por estrelar Psicose (1960), e da atriz e fotógrafa Berry Berenson (1948-2001), que morreu nos ataques do 11 de Setembro, como passageira no voo 11 da American Airlines. Perkins é o autor de um fenômeno midiático e comercial, Longlegs (2024), terror em que um irreconhecível mas inesquecível Nicolas Cage encarna um serial killer: custou menos de US$ 10 milhões e arrecadou US$ 126,9 milhões.
O macaco do título é um brinquedo que toca tambor e que um piloto de avião chamado Petey Shelburn (Adam Scott, da série Ruptura) tenta devolver em uma loja de antiguidades. Antes que ele consiga, uma reação em cadeia faz com que um lançador de arpões seja acionado, estripando o dono do estabelecimento.

Um tempo depois, Petey desapareceu, e cabe a sua esposa, Lois (Tatiana Maslany, dos seriados Orphan Black e She-Hulk), criar os filhos gêmeos, Hal e Bill — vividos por Christian Convery, protagonista da série Sweet Tooth (2021-2024). O macaco ficou guardado no armário, como símbolo da ausência paterna. Os irmãos acabam encontrando o brinquedo. Ao darem corda, sem querer provocam a decapitação acidental de sua babá.
As rusgas entre Hal e Bill levam um dos garotos a recorrer ao macaco para concretizar o desejo pela morte do outro. Mas as coisas dão muito errado.
Uns 25 anos depois, os dois irmãos são interpretados por Theo James, visto na segunda temporada de The White Lotus. Hal está afastado de Bill e de seu próprio filho, Petey, a quem vê apenas uma vez por ano, por medo de que o macaco retorne e o mate. Quando Bill telefona, o passado volta à tona, e os dois irmãos terão de lidar com a herança nefasta deixada pelo pai.
A história de O Macaco traz várias das marcas de King. Os personagens que, na infância ou na adolescência, foram negligenciados ou abandonados (não necessariamente de forma voluntária) pelos adultos. A eterna luta do Bem contra o Mal, no filme explicitada pela divisão do protagonista original em dois irmãos gêmeos idênticos. O abraço ao medo, ao terror e ao sobrenatural. O isolamento — físico ou emocional — que funciona como detonador de conflitos. A presença constante da morte e o impacto duradouro do trauma, que podem andar lado a lado com a capacidade humana da resiliência e a possibilidade de redenção.
O problema, para o meu gosto, é que o diretor Osgood Perkins resolveu dar uma roupagem cômica a todos esses elementos dramáticos e sinistros. As sucessivas mortes sangrentas em situações bizarras — que remetem à franquia Premonição, iniciada em 2000 — miram mais no riso do espectador do que no seu choque.

Em entrevista à revista Empire, Perkins justificou, dizendo que fez "uso extremo de sangue para brincar sobre o absurdo, a inutilidade e a aleatoriedade da morte".
— Eles (a produtora Atomic Monster) tinham um roteiro muito sério. Muito sério. Eu disse a eles: "Isso não funciona para mim". O problema com esse macaco de brinquedo é que as pessoas ao redor dele morrem de maneiras insanas. Bem, sou especialista nisso. Meus pais morreram de maneiras insanas, que viraram manchetes (durante dois anos, Anthony Perkins escondeu do público que tinha aids, entrando e saindo de hospitais sob nome falsos; enquanto isso, sua esposa, que viria a morrer no 11 de Setembro, e seus filhos eram testados regularmente para o vírus HIV). Passei grande parte da minha vida me recuperando de uma tragédia, me sentindo muito mal. Tudo parecia inerentemente injusto. Você personaliza a dor: "Por que isso está acontecendo comigo?". Mas estou mais velho agora, e você percebe que essa merda acontece com todo mundo. Todo mundo morre. Às vezes dormindo, às vezes de maneiras realmente insanas. Mas todo mundo morre. E pensei que talvez a melhor maneira de abordar essa noção insana seja com um sorriso.
O resultado, porém, é um filme que nem é engraçado, nem é perturbador. É muito niilista para engajar emocionalmente o público, mas também muito limpinho para causar algum tipo de assombro, ainda que se perceba o esforço para demonstrar engenhosidade nas cenas de morte. Absolutamente morno e desprovido de personagens interessantes (tanto pior que Theo James seja um ator com recursos limitados), O Macaco só vale para quem é fã de carteirinha do Stephen King e firmou como objetivo assistir a todas as adaptações da obra do escritor.
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