
Ninguém pode dizer que foi enganado pelo prefeito Sebastião Melo na campanha eleitoral em relação à concessão do Dmae para a iniciativa privada. Todas as vezes em que foi questionado sobre o tema, o candidato Melo deixou claro que não via como manter o Dmae 100% público. Que sem dinheiro privado seria impossível cumprir o marco regulatório do saneamento, que prevê chegar a 2033 com 99% da população tendo acesso a água potável e 90% com tratamento de esgoto.
Melo usava um eufemismo, a apalavra “parceirização”, mas o vocábulo correto é concessão. A decisão agora é por uma concessão parcial — o Dmae segue captando e tratando a água e a empresa que vencer a licitação distribui a água e se encarrega do tratamento do esgoto, que hoje não chega a 50% em Porto Alegre.
Água e esgoto são serviços públicos, que os municípios podem explorar diretamente, como fazem hoje Porto Alegre, Caxias, Pelotas, São Leopoldo ou Novo Hamburgo, por exemplo. Ou podem conceder a uma empresa pública ou privada. Por muitos anos, a maioria dos municípios concedeu à Corsan o direito de explorar o serviço de captação, tratamento e distribuição de água. O esgoto ficou para trás.
Com as exigências do marco de saneamento, o governo de Eduardo Leite concluiu que a Corsan não tinha como investir o dinheiro necessário para atingir as metas até 2033 e vendeu a Corsan para a Aegea, que manteve o nome da empresa. A empresa é forte candidata a arrematar o Dmae, por conhecer o território, já atuar na Região Metropolitana e ter a expertise de operar serviços de saneamento em cidades grandes e completas, como o Rio de Janeiro.
Quando Melo trouxe o procurador Bruno Vanuzzi para ser o diretor-geral do Dmae, ficou ainda mais claro que seu papel seria o de preparar a concessão. Vanuzzi é especialista em parcerias público-privadas. Foi secretário da área na gestão de Nelson Marchezan em Porto Alegre e do governo do Estado até receber um convite para trabalhar na Multiplan, empresa de shopping centers e construção civil.
Do outro lado do balcão, Vanuzzi era o interlocutor da Metroplan com a prefeitura no cumprimento das contrapartidas exigidas nos empreendimentos imobiliários. Conhece, portanto, os dois lados da moeda.
Ao cidadão não importa se a distribuição de água e o tratamento de esgoto são públicos ou privados. O que ele quer é água na torneira, com o mínimo de interrupções, e esgoto tratado, a preço justo. Esse é um ponto de interrogação: quanto vai se pagar pelo serviço privado, se com o que arrecada hoje o Dmae não consegue fazer as obras necessárias?