
A menina Júlia Giovanaz Nunes cresceu em Gramado dos Loureiros ouvindo a mãe, Rose, contar que trabalhou na lavoura de fumo até os 20 anos e queixar-se de que o pai dela morrera cedo em consequência do contato com a nicotina na pele.
Júlia saiu da pequena propriedade da família e foi estudar numa das melhores escolas do Rio Grande do Sul, o Colégio Liberato Salzano, de Novo Hamburgo.
Fez o Ensino Médio profissionalizante de Técnico em Química. Na hora de escolher o tema da sua pesquisa para o trabalho de conclusão, a história familiar serviu como ponto de partida.
Aos 18 anos, Júlia e a colega Franciele Pedroso Carrara, 17 anos, pesquisaram e descobriram que não existia no mercado um produto para proteger a pele dos fumicultores daquele mel grudento e repleto de nicotina que a folha do tabaco deixa na pele.
Decidiram trabalhar no desenvolvimento de um creme que, a exemplo do protetor solar, permitisse aos trabalhadores colher o fumo sem vestir as roupas de plástico, excessivamente pesadas e desconfortáveis no verão, época da colheita.
Do trabalho de conclusão do curso nasceu o Protege — creme de proteção contra a doença da folha verde do tabaco.
Entrevista na Gaúcha
Essa história Júlia contou na quarta-feira passada, em entrevista à Rádio Gaúcha, durante a Expoagro Afubra em Rincão del Rey, Rio Pardo.
Ela não estava no roteiro de entrevistas, mas a mãe me ouviu dizer na abertura do programa que já trabalhei com fumo e que não tinha saudade daquele mel que deixava as roupas imprestáveis e a pele grudenta. E sugeriu que Júlia se apresentasse à produção.
Kyane Sutelo, nossa produtora, percebeu na hora que estava diante de um caso inspirador. Claro que Andressa Xavier e eu mudamos o roteiro na hora para contar essa história de meninas empreendedoras, que hoje são sócias na Protege Química.
Júlia e Giovana vivem da empresa que produz o creme, patentearam a descoberta (uma mistura de silicones que forma uma camada protetora e não deixa a nicotina entrar em contato com a pele).
As indústrias e os agricultores do Rio Grande do Sul compram toda a produção, mas elas estão preparadas para expandir a fábrica. E mais: vão incorporar um protetor solar ao creme, para que tenha dupla finalidade.
Aos 24 anos, Júlia é a única brasileira na final de um concurso mundial que será disputado na África do Sul e que premia jovens empreendedoras com menos de 30 anos, que continuem estudando.
Ela faz Economia na UFRGS e se divide entre Santa Cruz e Porto Alegre. Já esteve em Dubai, apresentando o produto que deve ganhar o mundo. Sua história inspiradora deveria ser contada no South Summit, porque é inovação aplicada à vida real.
São duas meninas que têm a patente de um produto desenvolvido na escola em um país tão carente de patentes porque pouco investe em pesquisa e patina na inovação.