Um aumento de 62% quando a inflação anual está na casa dos 3% é incompreensível para qualquer pessoa que não esteja acompanhando a novela do teto salarial em Porto Alegre. Foi isso que a Câmara de Vereadores aprovou no final da tarde de quarta-feira (12), pelo placar de 18 a 16.
Hoje, o prefeito Sebastião Melo ganha, brutos, R$ 21,4 mil. Seu sucessor (ou ele, se for reeleito) ganhará R$ 34,9 mil. O vice passará de R$ 14,2 mil para R$ 23,4 mil e os vereadores, de R$ 14,2 mil para 19,9 mil a partir de 2025.
Os secretários terão reajuste imediato e passarão de R$ 14,2 mil para R$ 19,9 mil. Desde que assumiu o cargo, em 2021, Melo reclama do baixo salário dos secretários e diz que, com esse valor, fica difícil atrair talentos. O próprio vice, Ricardo Gomes, que vem da iniciativa privada, diz que está no cargo e pretende concorrer a vice outra vez "por vocação", já que os R$ 11 mil líquidos que recebe significam muito menos do que ganhava como advogado.
Esses motivos não foram determinantes para a apresentação do projeto, apresentado pela Câmara, mas construído em sintonia com o Executivo. Trata-se de uma gambiarra para garantir o cumprimento da lei que definiu o salário do prefeito como o teto salarial do funcionalismo, mas há servidores que ganham na casa dos R$ 35 mil, especialmente da Secretaria da Fazenda. Os procuradores municipais ganham acima do teto, mas estão protegidos por uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que lhes dá o direito de receberem até o limite de um ministro do Supremo Tribunal Federal.
Os servidores que extrapolam o teto conseguiram garantir sua remuneração até aqui com base em decisões precárias da Justiça, mas estavam ameaçados de enquadramento na lei, o que significaria cair para os R$ 21,4 mil do prefeito. A revolta dos servidores de altos salários foi resolvida, mas o prefeito terá de administrar agora a inconformidade dos funcionários em geral, a quem o governo ofereceu 5,79%, em quatro parcelas, e correção de 10% no vale-alimentação, a contar de maio de 2023.
No final do ano passado, Executivo e Legislativo chegaram a essa fórmula esdrúxula, de elevar o salário do prefeito que tomará posse em um ano e meio e considerar que, desde já, o teto é esse. Não conseguiram aprovar no primeiro semestre, mas agora passou graças a três gambiarras: dois vereadores contrários ao aumento, Giovane Byl (PTB) e Mauro Pinheiro (PL) entraram com pedido de licença saúde e foram substituídos por Paulo Brum (PTB) e Nereu D’Ávila (PL).
João Bosco Vaz (PDT) pediu licença de dois dias para tratar de interesses pessoais. Não foi substituído e, assim, o governo conseguiu os 18 votos, dois a mais do que a soma de PT, PSOL, PCdoB, Novo e dissidentes da base do governo, como Clàudio Janta (Solidariedade).