A volta às aulas é o momento apropriado para se discutirem o papel da escola pública e o que precisa ser feito para que as crianças aprendam. O permanente embate entre governo e sindicatos de professores por questões salariais e de infraestrutura tem impedido que se discuta uma questão crucial para o futuro do Estado: como preparar os estudantes para competir em igualdade de condições com os egressos de escolas privadas ou os que chegam às melhores universidades graças ao investimento em cursos pré-vestibular ou de preparação para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Em Porto Alegre, o debate sobre o projeto político-pedagógico está contaminado pela divergência em relação às mudanças na forma como o prefeito Nelson Marchezan e seu secretário da Educação, Adriano Naves de Brito, reestruturaram a rotina nas escolas.
O pivô da discórdia é a decisão da prefeitura de exigir que os professores compareçam à escola todos os dias. Até agora, era possível ficar um dia em casa para preparar e planejar aulas e compensar as duas horas a mais feitas nos outros quatro dias, já que o tempo com os alunos, nos horários das refeições, era contabilizado na jornada de trabalho.
Diante da ameaça dos professores de não obedecer à determinação, o secretário da Educação avisa que poderá haver desconto no salário. Os diretores já foram avisados de que não poderão abonar o ponto de quem não for à escola no dia antes destinado ao planejamento. Brito diz que está assegurado o tempo de preparação das aulas, mas que não há como prescindir da presença do professor titular em um dia da semana nem dispensar os alunos duas horas antes, para as reuniões coletivas de planejamento.
– Sabíamos que alterar a rotina das escolas seria mexer em um vespeiro, mas o objetivo é aumentar as chances de as crianças aprenderem – diz o secretário.
Além dos testes oficiais para avaliar o nível de aprendizagem, a prefeitura vai criar um mecanismo próprio para identificar onde estão os problemas. Brito se recusa a aceitar a explicação de que as crianças da rede municipal têm pior desempenho porque vêm de áreas mais carentes da cidade. Quer provar que todos têm capacidade de aprender e que ao município cabe oferecer reforço aos que apresentam maiores dificuldades.
No primeiro dia do ano letivo, Brito passou a maior parte do tempo tentando apagar outro incêndio, provocado por um memorando distribuído na sexta-feira pelo setor de nutrição da Smed informando que, em consequência das dificuldades financeiras enfrentadas pela administração municipal, a quantidade de carne repassada para a merenda nas escolas iria diminuir.
O secretário diz que o memorando foi enviado sem o seu conhecimento e desconfia de algum tipo de boicote. A prefeitura divulgou nota dizendo que o texto é equivocado e não representa a posição do governo e que foi aberta uma investigação para saber "os motivos do envio do memorando, nos termos em que foi redigido".