
O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Os governos de Rússia e Ucrânia concordaram, na terça-feira (25), em iniciar um cessar-fogo nos conflitos no Mar Negro. As negociações, mediadas pelos Estados Unidos, ocorreram separadamente com cada uma das partes, mas focaram em uma única área: o Mar Negro.
A coluna questiona a razão de a guerra ser suspensa momentaneamente apenas nessa região.
O Mar Negro tem grande importância histórica, pois banha a Crimeia — república autônoma da Ucrânia anexada pela Rússia em 2014 — e foi palco dos primeiros ataques russos no sul do país europeu no início do conflito, em fevereiro de 2022.
No entanto, o principal motivo para a trégua localizada é a questão estratégica e econômica da região para ambos os países: a navegabilidade mercante.
— Se olharmos no mapa, o Mar Negro dá acesso ao resto do continente europeu. É uma rota crucial também para a Ásia Central e o Oriente Médio, além de ser essencial para o escoamento da produção ucraniana de insumos e fertilizantes. Já a Rússia tem interesse em exportar gás natural, petróleo e outras commodities — explica Roberto Uebel, professor de Relações Internacionais da ESPM-SP.
Para ilustrar a importância do Mar Negro, Uebel faz uma analogia com a Lagoa Mirim, no sul do Estado, na fronteira com o Uruguai.
— É basicamente a mesma dinâmica: navegação, escoamento de produção e controle do que entra e sai nos territórios.
Próximos passos
Ainda não há detalhes sobre quando o cessar-fogo entrará em vigor nem por quanto tempo durará. Outro ponto importante, segundo Uebel, será quem administrará a região.
— Em conflitos internacionais, sempre defendo a mediação de organismos multilaterais. Acredito que os Estados Unidos tenham interesse em assumir essa gestão, já que foram os mediadores. Não vejo, em um primeiro momento, um acordo compartilhado entre Rússia e Ucrânia, pois as hostilidades continuam. Mas a tendência é de que os EUA gerenciem a região, até para militarizá-la — avalia.
O professor também acredita que esse acordo pode abrir precedentes para tréguas mais amplas no futuro.
— Na semana passada, quando os dois lados estavam dispostos a negociar um cessar-fogo, falei que um cessar-fogo poderia abrir precedentes para outras declarações, e foi o que ocorreu. Imagino que possamos ter, a médio prazo, novos acordos para outros temas. E, quem sabe, até mesmo a construção de uma agenda para a pacificação — salientou.