
Complexa a situação do dique da Zona Norte, em Porto Alegre, que, de certa forma, resume dilemas de uma Capital que tem problemas de um país em desenvolvimento, com alto nível de desigualdade social, e, ao mesmo tempo, encara seu principal desafio: tornar-se mais segura após ter sofrido a maior tragédia ambiental de sua história.
Vamos olhar pelos dois lados: há um dique que precisa ter seu nível de proteção de 4 metros a 5,8 metros, no Sarandi, sob pena de, se houver outra chuva, como a de um ano atrás, o Rio Gravataí subir de novo e inundar milhares de casas.
Cerca de 1,1 km de obras já foram concluídas. A prefeitura estressou o diálogo com moradores que viviam, de forma irregular, sobre a estrutura - estive lá e testemunho que não se identifica o que é dique e o que são os terrenos das casas, uma ruela irregular, porque, está tudo misturado.
Das 57 famílias que estavam ali, 33 assinaram acordo para sair. Essa obra precisa ser feita - e estamos falando de 300 metros apenas de dique para sua conclusão. É justamente onde estão as 24 famílias que não aceitam deixar o local.
Na terça-feira (25), a Justiça negou pedido para retirada dessas famílias que moram junto à estrutura. Esse é o outro lado da história: são pessoas que entendem que os programas sociais disponibilizados por prefeitura e governo federal não são suficientes para lhes dar segurança. Pessoas que moram ali, de forma irregular, há pelo menos 10 anos. O "Estadia Solidária", ação municipal, paga um aluguel de R$ 1 mil mensais por até um ano enquanto o morador não adquire um novo imóvel. O "Compra Assistida" concede uma nova casa em outra região no valor de até R$ 200 mil.
Sabe-se da burocracia. Sabe-se que não é fácil encontrar um outro lugar para morar tão facilmente. Há o aspecto do território, há ainda algum oportunismo e - não se pode descartar - interesse político.
A prefeitura tem apostado, corretamente, no diálogo. Judicialmente, o Executivo municipal irá recorrer da decisão Cabe apresetnar provas robustas de que, sim, a retirada dessas pessoas é emergencial - tendo em vista o risco -, mas também é dever do Estado garantir que elas terão segurança para encontrar, com tempo, um lugar melhor para viver. Às famílias resistentes, cabe o direito de negociação transparente. A saída será um acordo, ainda que na Justiça. Diálogo, diálogo, diálogo.