Esvaziada pela ausência de pelo menos cinco países (Venezuela, Cuba e Nicarágua, que não foram convidados, e México e Bolívia, que se rebelaram contra a exclusão dos parceiros), a Cúpula das Américas, que ocorre esta semana em Los Angeles, só ganhou relevância, para nós, brasileiros, devido ao encontro entre os presidentes Joe Biden e Jair Bolsonaro, nesta quinta-feira (9).
Admirador de Donald Trump - de quem se dizia amigo, ainda que a recíproca não fosse necessariamente verdadeira -, Bolsonaro abraçou até o último minuto a narrativa do presidente derrotado, de que teria havido fraude na eleição americana. Assim, ao lançar dúvidas sobre o processo eleitoral dos Estados Unidos, o brasileiro foi o penúltimo presidente do mundo a parabenizar Biden pela vitória - o último foi Kim Jong-un.
A suposta amizade com Trump não rendeu grandes frutos para o Brasil, assim como a gélida relação com Biden também não causou grandes estragos. Diplomacia presidencial é importante, como já escrevi aqui, mas não determina, felizmente, os rumos dos negócios entre os dois países, que seguem normais, a despeito da falta de um aperto de mão - ou mesmo de um telefonema - em 18 meses.
Esperemos uma reunião morna, quase fria, em que serão tratados de forma muito superficial temas como segurança alimentar, transição energética, parcerias comerciais e tecnológicas. O encontro até serve para os dois lados - para Biden, a foto com Bolsonaro, presidente da maior economia da América Latina, mostra que os EUA estão, supostamente, reocupando seu espaço no subcontinente, para frear - também supostamente - os avanços da influência russa e chinesa. Para o brasileiro, servirá para dizer que ele não está isolado e que, ao contrário de líderes de ditaduras de esquerda, como Cuba, Venezuela e Nicarágua, o Brasil está lá, em Los Angeles, sendo recebido pelo líder da mais tradicional democracia do planeta.
No entanto, a reunião chega tarde para os dois: se Bolsonaro for derrotado nas eleições em outubro, as relações entre os dois países serão tocadas por Biden pelo novo ocupante do Planalto. E o presidente americano, que deve perder a maioria no Congresso no pleito de meio de mandato, em novembro, também estará em grande parte com as mãos amarradas.
A despeito das rixas, Bolsonaro participou de dois momentos importantes para a Casa Branca - as cúpulas do ambiente e da democracia, projetadas por Biden para apresentar ao mundo sua agenda e dizer que os EUA estavam de volta à arena internacional, dispostos a exercer liderança. Mas a ida do presidente brasileiro à Rússia e o encontro de três horas com Vladimir Putin, poucos dias antes da invasão da Ucrânia, é algo atravessado na garganta dos democratas mais próximos a Biden.
Aliás, o tema da Rússia deve continuar assim, exatamente, como está: atravessado na garganta dos homens e mulheres mais próximos do presidente dos EUA. Biden não deve tocar no assunto durante a reunião desta quinta-feira (8).
O encontro, que deve durar entre 20 e 30 minutos, ficará dentro das quatro linhas da diplomacia, sem assuntos espinhosos ou improvisos. Nos bastidores, diz-se que uma das exigências de Bolsonaro para ir a Los Angeles é de que ele não seja cobrado por Biden em questões ambientais ou sobre democracia. Assim, tudo o que tiver de ser dito com relação a esses dois temas sairá da boca de assessores. Antes, durante e depois do encontro.