Às vésperas de embarcar para Los Angeles, para participar da Cúpula das Américas, nos Estados Unidos, o presidente Jair Bolsonaro disse que "houve um congelamento" na relação dos Estados Unidos com o Brasil, após a posse de Joe Biden, em janeiro de 2021.
A chamada diplomacia presidencial é importante, mas não, as relações entre Estados - e principalmente entre empresas - não dependem dos gostos ou ideologias dos líderes políticos que ora estão no poder. Fosse isso, o comércio entre Brasil e Estados Unidos teria decolado entre janeiro de 2019, quando Bolsonaro assumiu, e janeiro de 2021, quando Donald Trump deixou, com relutância, o poder nos Estados Unidos. Mais: pouco mudou desde que o democrata assumiu a Casa Branca. Os americanos continuam sendo os segundo parceiros comerciais brasileiros. E, a depender dos humores do Planalto, os negócios entre o Brasil e a China comunista, os maiores compradores do país, teriam minguado nesses anos.
Diplomacia presidencial é importante - mas não, não define os rumos das relações bilaterais. Algumas coisas andam quase em modo automático. Aliás, como já comentei aqui, as relações entre a França e o Brasil andam assim desde as rusgas entre Bolsonaro e Emmanuel Macron, que, aliás, foi reeleito este ano.
Dito tudo isso, é positivo que o presidente do maior país da América Latina se reúna com o líder da maior potência econômica/militar do planeta. Bolsonaro e Joe Biden não morrem de amores um pelo outro - e nem precisam. Luiz Inácio Lula da Silva também não nutria simpatia pelas ideias de George W. Bush em uma das esquinas mais dramáticas da história do século 21 - a guerra do Iraque, após o Afeganistão e o 11 de setembro de 2001.
Mas é melhor que se encontrem. Haverá, por certo, algum constrangimento: Bolsonaro foi um dos últimos chefes de Estado a felicitar Biden pela eleição e abraçou-se até o fim a Trump, comprando sua desconfiança, quase doentia, pela suposta fraude no pleito de 2020. Biden sabe de tudo isso. E sabe também que Bolsonaro mobiliza sua base, utilizando-se da fratura social e política americana: não à toa o brasileiro irá, após a Cúpula das Américas à Flórida, um Estado majoritariamente republicano, inaugurar o vice-consulado de Orlando, algo pouco comum na diplomacia.
Desde que tomou posse, Biden, por sua vez, evitou gestos de aproximação com Bolsonaro e nunca conversou - nem por telefone, com o brasileiro. Diante do risco de que a Cúpula das Américas fosse um fiasco, com ausência de dois líderes dos maiores países do continente - além de Bolsonaro, o mexicano Andrés Manuel Lopez Obrador, ameaçou não comparecer - a Casa Branca fez gestos de aproximação com Brasília. Além do encontro com o americano, autoridades brasileiras negociam reuniões bilaterais com o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, e com chefes de Estado de Colômbia, Guatemala e El Salvador. É a hora de Bolsonaro surfar no cenário internacional, algo que não fez em quatro anos. É talvez sua última oportunidade antes do início da campanha eleitoral, ainda que não mude, a essa altura, a imagem preocupante do Brasil visto de fora.