Em seu primeiro show no Brasil, Roger Waters provocou polêmica ao exibir no telão do Allianz Parque, em São Paulo, os nomes de sete líderes políticos, segundo ele "neofascistas" atuais. Encerrava a lista o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro.
Sob o título "O neofascismo está em ascensão", na relação do ex-líder do Pink Floyd apareciam Donald Trump (EUA), Vladimir Putin (Rússia), Viktor Orban (Hungria), Marine Le Pen (França), Sebastian Kurz (Áustria), Farage (deputado do Reino Unido) e Kaczinski (Lech e Jaroslaw, da Polônia). Na coluna de quinta-feira em GauchaZH, expliquei quem é quem. Abaixo do texto, nos comentários, leitores questionaram a lista, nominando outros autoritários no poder, só que de esquerda: Hugo Chávez, Nicolás Maduro e alguns dinossauros vermelhos.
O século 20 produziu regimes autocráticos tanto de direita quanto de esquerda. Genocídios ocorreram na Alemanha de Adolf Hitler, na URSS de Josef Stalin e no pouco lembrado Camboja de Pol Pot.
Militarismo e nacionalismo também não escolhem matizes ideológicos: são qualificações de regimes de direita, como os que o Cone Sul conheceu nos anos 1970, e de esquerda: está aí para provar o tenente-coronel paraquedista Hugo Chávez e seu fetiche bolivariano.
Também não é primazia da direita parir governantes homofóbicos. Lembro que em abril de 2006, no auge do chavismo na América Latina, fui despachado, como repórter de ZH, para o Peru para cobrir a eleição que opunha Alan García e um até então desconhecido militar da reserva chamado Ollanta Humala, financiado e apadrinhado por Chávez.
Uma das polêmicas da campanha era o fato de o candidato criticar a comunidade LGBT. O auge da crise foi quando a mãe de Humala disse que gays deveriam ser fuzilados. Lembro de ter entrevistado seus pais, em uma cafeteria na periferia de Lima, e ela ter reiterado: "Ser homossexual é um escândalo".
Em tempo: Humala perdeu aquela eleição, mas chegaria à presidência anos depois, até acabar preso em 2017 acusado de lavagem de dinheiro relativa a doações feitas pelo grupo Odebrecht para o Partido Nacionalista nas campanhas presidenciais de 2006 e 2011.
Como se vê, nem corrupção nem genocídio e tampouco homofobia são crimes apenas da extrema-direita. A ultraesquerda tem seus esqueletos no armário. Também não são exclusividades de um e outro o enriquecimento ilícito, embora líderes de extrema-esquerda se autoproclamem socialistas em defesa da construção de um mundo justo e igualitário. Vale lembrar que Kim Jong-un, o ditador comunista da Coreia do Norte, costuma nadar em piscinas de seu palácio, enquanto sua população padece sob o regime mais fechado do planeta.
A seguir, quem é quem entre os "neocomunistas".
Nicolás Maduro (Venezuela)
O venezuelano herdeiro de Hugo Chávez tem levado seu país ladeira abaixo, protagonizando uma crise humanitária na América Latina. O golpe de morte de Nicolás Maduro na democracia ocorreu ao patrolar a Assembleia Nacional. Todos os poderes do Estado da Venezuela - executivo, legislativo e judiciário - estão nas mãos de Maduro. A imprensa é calada e perseguida. A economia está aos frangalhos. A inflação anual atinge 81.000%. Falta comida, papel higiênico e medicamentos. O resultado: fuga em massa da população para Colômbia, Equador e Brasil.
Raúl Castro (Cuba)
Ainda que tenha se afastado da presidência no ano passado, o irmão de Fidel segue firme mandando e desmandando no Partido Comunista de Cuba. Também segue como comandante das forças armadas. Ou seja, nenhuma folha se mexe na Ilha sem que ele saiba. Ainda que tenha assinado o acordo de reaproximação com os EUA — rasgado por Donald Trump —, Raúl Castro manteve, em seu governo, os pilares da ditadura: regime de partido único, imprensa amordaçada, presos políticos e violações de direitos humanos.
Xi Jinping (China)
Embora as críticas a seu regime sejam tímidas, em função de interesses comerciais, o líder máximo da China comanda uma ditadura clássica de partido único, o Partido Comunista. Nos últimos anos, Xi Jinping tem centralizado o poder, governa como um imperador e em um culto ao personalismo do líder que remonta aos tempos de Mao Tsé-tung e Deng Xiaoping. Na quinta-feira, seu governo ratificou a legalidade de campos de internação onde cerca de 1 milhão de pessoas de minorias muçulmanas são mantidas para doutrinação - mandarim, educação ideológica, reabilitação psicológica e correção de comportamento. Ex-detentos dizem que foram obrigados a renegar o islamismo. Também é conhecida a perseguição do regime à minoria budista no Tibete.
Daniel Ortega (Nicarágua)
Símbolo de uma geração que sonhou com a Revolução Sandinista na Nicarágua, Daniel Ortega seguiu a sina dos líderes de esquerda que, uma vez no poder, após a derrubada de ditaduras latino-americanas, se converteram em déspotas. Apegado ao poder, tem perseguido grupos de oposição. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos denunciou "práticas de terror, com detenções em massa e assassinatos", episódios que constrangem a esquerda latino-americana.
Evo Morales (Bolívia)
Há 12 anos no poder, é o presidente mais longevo da América do Sul. Deu um drible jurídico no Tribunal Constitucional no ano passado para ser candidato à presidência da Bolívia pela quarta vez em 2019, algo proibido na atual Carta Magna (uma Constituição que ele próprio aprovou). Ele pouco lembra o líder que ficou famoso por nacionalizar empresas do setor de gás e petróleo no primeiro mandato. Deixou o discurso de alinhamento com Venezuela e Cuba e hoje recebe elogios do FMI e Banco Mundial. Setores mais à esquerda dizem que ele se aburguesou. No entanto, mantém o Judiciário sob controle e segue perseguindo adversários.
Kim Jong-un (Coreia do Norte)
Quem vê o sorridente Kim Jong-un ao lado de Donald Trump nas fotos da histórica cúpula de Singapura pode esquecer que ele é um dos maiores ditadores da atualidade. Desde que assumiu o lugar do pai, ele instaurou um regime de terror na Coreia do Norte para consolidar seu poder - nesse sentido, as armas nucleares também deram por anos sustentáculo a seu regime. Segundo o Instituto de Estratégias de Segurança Nacional, baseado na Coreia do Sul, Kim ordenou mais de 340 execuções desde 2011. Uma das primeiras vítimas foi seu tio, Jang Song-thaek. Seu regime de partido único, o PC norte-coreano, mantém a população e a imprensa sob cabresto.