
Francisco, como se sabe, era um piadista: costumava dizer que, antes de morrer, precisava preparar o apartamento dele na casa de Maria. Pois a "casa" onde o Papa descansará para sempre é a Basílica de Santa Maria Maggiore, no centro de Roma. E o "apartamento" ficará entre a estátua da Rainha da Paz e o altar onde está posicionada uma pintura da Virgem que teria sido confeccionada por São Lucas, um dos quatro evangelistas.
Nesta quinta-feira (24), cumpri, de táxi, parte do trecho que será percorrido pelo cortejo com o corpo do Pontífice, na sexta-feira (25), entre o Vaticano e a basílica. São cinco quilômetros, normalmente feitos em 20 minutos. Levei 40, em um sinal de que Roma, superlotada para se despedir de Francisco, começa a enfrentar dias tumultuados. O taxista, Andrea, me diz que, a partir desta quinta-feira, é melhor não circular de transporte público. A melhor escolha é caminhar. Em razão dos cerca de 200 líderes internacionais que são aguardados para a missa de despedida, entre eles Donald Trump, Emmanuel Macron e o presidente Lula, a cidade eterna estará, como poucas vezes se viu na história, blindada.
A última morada escolhida por Francisco ficará no corredor à esquerda da linda basílica, a primeira dedicada a Maria, em Roma. Ontem, tapumes de madeira ocupavam o local exato onde o caixão será depositado. Desde a morte de Francisco e a divulgação de seu desejo de ser sepultado ali, o número de visitantes se multiplicou. Entrei após passar por revista e detectores de metal em cerca de 20 minutos, mas, à tarde, a espera na fila passava de uma hora.
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Construída no século 5, a igreja, uma das sete basílicas papais, conta com uma relíquia, segundo a fé católica: embaixo do altar, protegidas por cristal, estão pedaços de madeira que seriam da manjedoura do Menino Jesus. Sete papas estão sepultados no prédio, um número bem menor do que o total que repousa na cripta vaticana e na basílica de São Pedro: 90. O último Pontífice que decidiu ser enterrado fora dos muros da Santa Sé foi Leão XIII, em 1903. Seus restos mortais estão na Arquibasílica de São João de Latrão.
Francisco, que rezava em frente ao quadro da Virgem na Maggiore antes e depois de cada viagem apostólica, pode não ter optado pelo local com o propósito de enviar mais uma de suas mensagens ao mundo. Afinal, o Papa não era adepto de subterfúgios. Dizia o que pensava. Mas, conscientemente ou não, até na morte, ele rompe com mais uma vez tradição.