Se for verdadeiro o dossiê russo com supostas fotos de orgias em um hotel em Moscou, Donald Trump passará os próximos quatro anos nas mãos do Kremlin. Se for mentiroso, como alega o próprio Trump e o governo da Rússia, o presidente eleito estaria, no mínimo, sendo vítima do mesmo fenômeno que ajudou a elegê-lo: as fake news, notícias falsas. Verídicas ou mentirosas, as 35 páginas do relatório americano têm mais cara de panfleto do que de documento sigiloso, mas tomaram as últimas 24 horas do noticiário político americano. Só houve trégua na baixaria nos 50 minutos de pronunciamento de Barack Obama, na noite de terça-feira, em Chicago. Antes e depois da despedida do democrata, analistas sérios, sites de fofoca e redes sociais misturaram-se na mesma gosma sensacionalista de especular sobre os requintes sexuais do agora presidente, uma versão americana das “bunga bunga”, como eram chamadas as festinhas do ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi com prostitutas, algumas menores de idade.
Bem-vindos aos anos Trump, um presidente que, a nove dias de assumir, bate-boca com repórter da CNN ao vivo para o mundo:
– Você eu não deixo perguntar, porque você publica notícias falsas.
Ou que compra briga, pelo Twitter, com as agências de inteligência que irá comandar: “Vivemos na Alemanha nazista?”, questionou ontem pela manhã, indignado com os vazamentos do documento russo.
Ao longo de todo o dia, a palavra no noticiário americano foi “kompromat”, expressão herdada do jargão soviético que designa informações comprometedoras sobre pessoas suscetíveis de serem submetidas a chantagens.
Esqueçam o Trump paz e amor, aquele recém-eleito que teria suavizado o discurso da campanha. Ontem, ele deixou claro que irá construir “em breve” o muro com o México – e não será uma cerca. Também fará o país vizinho pagar a conta. A entrevista coroou a transição presidencial mais turbulenta da história americana. Antes mesmo de assumir, ele governa pelo Twitter. Em 140 caracteres, mexe com as bolsas mundiais, questiona a democracia do país, briga com a imprensa e responde ao que chama de “histeria americana sobre a Rússia”, nação que considera amiga.
Está só começando.