No dia em que a pandemia completa um ano no Rio Grande do Sul, minha maior aflição talvez seja a mesma que a sua: como é angustiante constatar que a doença se aproxima. Pela primeira vez em 12 meses, é claríssima a percepção de que o vírus está à espreita, nos cercando, nos rondando o tempo todo.
Cada vez mais gente próxima adoece ou morre. Tenho dois grandes amigos - eles são irmãos - que já perderam a avó, estão com o pai entubado e a mãe piorando. Já os filhos do meu padrasto, pessoas jovens, de 40 e poucos anos, atravessam dias inteiros gemendo de dor e respirando mal dentro de casa.
São muitos nessa situação, sofrendo em casa, torcendo para que o quadro melhore logo – porque, se não melhorar, talvez seja preciso recorrer ao nosso combalido sistema de saúde. Imagine o temor dessa gente:
– Se minha respiração piorar ainda mais, se eu precisar de UTI, será que vai ter leito para mim?
Que desespero! E nós, que não adoecemos, de alguma forma também nos sentimos asfixiados. Porque o vírus vai avançando, nos oprimindo, matando gente à nossa volta – eu tenho medo de sair de casa, de ir ao mercado. Por outro lado, uma certa culpa me acomete sempre que me sinto assim, tão vulnerável. Afinal, sou um privilegiado, trabalho no abrigo do meu apê – vários colegas de GZH passam o dia na rua, assim como frentistas, cobradores de ônibus, atendentes de supermercado, profissionais de saúde.
E o vírus faz isso: parece que nem sofrer a gente pode, porque há sempre alguém em situação pior. Há sempre alguém mais exposto, alguém morrendo, alguém perdendo um parente. E também há sempre alguém para dizer:
– PG, de que adianta essa choradeira? Isso é alarmismo, isso assusta a população!
Mas não quero assustar ninguém. Até porque, se algum leitor, neste momento, não está assustado, provavelmente vive em Marte ou sofre de algum transtorno mental. Aliás, minha única intenção com este texto é justamente mostrar para os assustados, para quem tem receio de sair de casa, para quem se sente isolado, angustiado, abatido, que vocês não estão sozinhos. Estamos juntos.
Às vezes, em tempos difíceis, a única coisa de que precisamos é de uma palavra de apoio. Por isso deixo aqui meus sinceros sentimentos a quem perdeu algum ente querido – não deve estar sendo fácil, eu sei. E deixo também meu afetuoso abraço a todos que, como eu, se sentem tão violentamente atingidos. Paciência, amigos: não vai durar mais um ano.