Já deu, chega, ninguém aguenta mais. Desde as jornadas de junho de 2013, desde os protestos contra a Copa, desde as paralisações do setor público, desde a eleição de 2014, desde o processo de impeachment, desde os atos contra Dilma, desde os atos a favor de Dilma, desde a revolta dos caminhoneiros, desde o movimento Fora Temer, desde a eleição de 2016, desde a rebelião secundarista, desde que essa tensão política se abateu sobre o país, o recado sempre foi um só. Um só!
Todos esses protestos, não importa se alinhados à esquerda ou à direita, tiveram um princípio análogo, um objetivo moral que norteava qualquer manifestante. Pelo amor de Deus, Michel Temer, entenda o que as ruas vêm tentando dizer há quase quatro anos8. Porque um político que não entende as ruas não pode ser político.
Vou desenhar para o senhor, presidente: as ruas diziam, e ainda dizem, que não se admite um governo gastar bilhões em estádios enquanto houver hospitais desmoronando. Que não se admitem mordomias a deputados enquanto continuar subindo a passagem de ônibus. Que não se admite salário alto para um ministro se o do professor for ridículo. Que não se admitem corrupção, benesses, conluios, cambalachos e safadezas.
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Mas aí o senhor, presidente, aí o senhor faz o quê? O senhor indica um ministro do governo para ser ministro do Supremo! Inacreditável! É um deboche, uma chacota, uma zombaria tirânica com centenas de milhares que foram às ruas, é a implosão moral desse governo cara de pau. Alexandre de Moraes sai do governo, onde era chefe da Polícia Federal, para participar do julgamento do que a Polícia Federal investiga! Ele estava no meio dos investigados e agora vai julgar os investigados!
A tese de doutorado de Alexandre de Moraes, em que ele sugere critérios para a escolha dos ministros do Supremo, é um sopapo na cara do país. Você talvez já tenha lido, mas isso aqui merece replay: "É vedado (para o cargo de ministro do Supremo) o acesso daqueles que estiverem no exercício ou tiverem exercido cargo de confiança no Poder Executivo (...) durante o mandato do presidente da República em exercício no momento da escolha, de maneira a evitar-se demonstração de gratidão política ou compromissos que comprometam a independência de nossa Corte Constitucional".
Tive um ataque de riso ao ler isso – Moraes é contra a nomeação dele próprio. É um espetáculo de cinismo e desfaçatez o que esse governo promove. Michel Temer defendeu uma impiedosa reforma da Previdência mas se aposentou aos 55 anos. Prometeu um ministério de notáveis mas preferiu uma trupe de questionáveis. Lutou pela PEC do Teto mas torrou R$ 500 mil em um evento para homenagear o samba. Pregou o corte de despesas mas seu governo gastou R$ 24 milhões em quatro meses com cartão corporativo – R$ 2 milhões a mais do que no semestre anterior inteiro.
Não há tensão política que se aplaque, e não pode mesmo se aplacar, quando um governo esnoba uma mensagem que há quatro anos vem das ruas. Temer é um presidente arcaico, ultrapassado, é o resumo mais bem acabado do que o Brasil, à esquerda ou à direita, já mostrou que não tolera. Já deu, chega, por favor, ninguém aguenta mais.