A iniciativa de prefeituras e entidades empresariais para reduzir o número de famílias que recebem Bolsa Família precisa ser muito bem dosada. Pode ser bem-sucedida se apresentar alternativa consistente. Mas dado o momento da economia brasileira, precisa pensar à frente com muita responsabilidade.
A explosão do benefício ocorreu no período pré-eleitoral, em 2022, quando se chamava Auxílio Brasil e teve critérios "flexibilizados". O governo Lula vem fazendo operação pente-fino que avança muito lentamente. Como essa iniciativa surgiu dentro do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, o titular da pasta, Wellington Dias, está permanentemente sob ameaça de substituição por adotar ação que mina a popularidade presidencial.
Chama atenção que o RS tenha o quarto menor percentual de beneficiários em relação à população total. Isso sugere que a proporção de fraudes e distorções também seja menor no Estado. Prefeituras podem atuar porque são as responsáveis pelo Cadastro Único, sistema que dá acesso ao programa, mas precisam fazê-lo de forma muito criteriosa. Podem ajudar, por exemplo, garantido creches para que mães em idade ativa possam estar disponíveis para trabalhar.
Já as entidades empresariais podem contribuir muito se montarem um programa de qualificação da mão de obra, para que a formalização seja não só uma possibilidade concreta como também uma alternativa atraente em termos salariais. Jornadas adequadas ajudarão a compor esse cenário.
Especialistas em mercado de trabalho estão longe da unanimidade sobre a correspondência entre o número de beneficiários do programa e a falta de pessoal treinado para o mercado de trabalho. Quando traçam uma relação, veem maior impacto no mercado de trabalho informal, não no formal. Afinal, há uma diferença enorme entre o pagamento médio de R$ 659,04 e o salário mínimo de R$ 1.518.
Ainda é preciso levar em conta outro fator que reduz a disponibilidade de mão de obra formal: oportunidades de atuar em entregas ou como motorista de aplicativo competem com salários e jornadas oferecidos no mercado formal.
Quanto ao atual momento da economia brasileira, há outro alerta importante: os dados ainda mostram um cenário de pleno emprego, há sinais de que a atividade deve desacelerar, especialmente no segundo semestre. Se o esforço de reduzir os beneficiários do Bolsa Família coincidir com um mercado de trabalho menos aquecido, pode deixar famílias na miséria e contribuir para gerar mais rejeição ao universo formal, que contrata e demite em ciclos.