Como a coluna havia observado, a melhor hipótese para o presidente da Argentina, Javier Milei, foi afirmar que caiu em um golpe ao "difundir, não promover" – versão dele –, a criptomoeda $Libra. Na noite de segunda-feira (17), mais de 48 horas depois do escândalo, o presidente argentino deu a primeira entrevista sobre o caso.
A conversa com Jonatan Viale, do canal Todo Notícias – que pertence ao jornal Clarín e é comparável à GloboNews no Brasil – estava marcada há cerca de duas semanas, como fizeram questão de esclarecer entrevistado e entrevistador.
A versão presidencial foi a de que Milei "levou uma bofetada" (me comí un cachetazo) por ser "tecnotimista". Ainda afirmou que pouquíssimos argentinos perderam dinheiro – a maioria, segundo ele, teria sido de americanos e chineses – e só admitiu ter errado "ex-post" (usando jargão de economistas, que significa "depois", ou à luz das consequências).
– Às vezes, não me dou conta de que sou presidente – chegou a alegar.
Para além da exploração da oposição, no primeiro dia útil depois do escândalo, que ocorreu no final da tarde de sexta passada, a bolsa de valores de Buenos Aires despencou 6%.
Nesta terça, os efeitos continuaram com a queda de até 6% de ADRs, papéis negociados nos Estados Unidos que representam ações emitidas na Argentina. Pode ser um ajuste em relação ao dia anterior, quando a bolsa de Nova York não operou pelo feriado do Dia do Presidente. Mas também pode indicar aumento da incerteza entre investidores, que agora olham com receio a figura de Milei.
Ao relatar como teria levado a "bofetada", Milei relatou que foi procurado por um argentino, Mauricio Novelli, que lhe apresentou a Hayden Mark Davis, um americano com um projeto.
– Minha intenção era promover um projeto que facilitasse o aceso a financiamento para pequenas e microempresas ("pymes" na Argentina), me deixei levar pelo entusiasmo — disse o presidente argentino.
Em seguida, perguntado sobre a perda de dinheiro dos que apostaram na cripto, derrubou a própria tese ao afirmar que quem investe nesse tipo de projeto são "operadores de alto risco" em um mercado se comporta como "cassino" – o que é verdade. Mas se é assim, como poderia financiar empreendedores de forma sustentável?
— Se você vai a um cassino e perde dinheiro, qual é a queixa? — provocou.
Milei admitiu ter "aprendido" com o episódio. Qual a lição? "Aumentar filtros" e "colocar muralhas" para que não seja "tão fácil chegar a mim". Durante a entrevista, o presidente argentino usou várias vezes a palavra "fintech" para se referir ao Tech Forum, evento organizado por Novelli, o intermediário do contato com a empresa que lançou a $Libra. A certa altura, afirmou:
— Não entendo nada de criptomoedas.
Atenção para memecoins
Uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo, a Binance, define memecoins como uma categoria construída não com base em inovação tecnológica, mas no poder coletivo da cultura da internet. Seu valor não é baseado na utilidade ou na escassez, mas no humor compartilhado e na disposição de acreditar na piada.
E adverte: "Para o usuário médio, envolver-se com memecoins significa um experimento de alto risco com psicologia coletiva. O primeiro princípio que os usuários devem lembrar é que esses tokens desafiam a lógica tradicional de investimento, prosperando não na utilidade ou valor fundamental, mas nas correntes inconstantes da viralidade". Isso, quando há boas conexões e intenções. Quando não há, fica ainda mais complicado.