A coluna já explicou por que um presidente eleito - qualquer que seja - não pode brigar com o mercado e por que a PEC da Transição, tal como pretendida pela equipe de transição, provoca medo de implosão da dívida.
Agora, é preciso detalhar por que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, precisa do mercado para cumprir as promessas feitas aos mais pobre.
A pretensão da equipe de Lula é tirar do teto de gastos despesas extras de R$ 198 bilhões. Nesse valor, caberiam o Bolsa Família com benefício de R$ 600, o adicional de R$ 150 por criança e um valor de R$ 105 bilhões destinado ainda um tanto vagamente à retomada do programa habitacional Minha Casa Minha Vida e a obras públicas, em tese aquelas interrompidas.
Mas por que é preciso "abrir espaço no orçamento"? Por que do total de R$ 5,03 trilhões em receita, 55% são financeiras, conectadas à gestão da dívida pública, e 45%, primárias, ou seja, arrecadação real. Essa "fatia real" do orçamento corresponde a R$ 2,3 trilhões. E desse valor, R$ 2,21 trilhões estão comprometidos com despesas obrigatórias, deixando "apenas" R$ 98,98 bilhões para as discricionárias, que quer dizer aquelas que o governo decide fazer sem estar forçado a isso por regras legais.
Entre as obrigatórias, estão R$ 957 bilhões com Previdência e mais R$ 545 bilhões em repasses a Estados e municípios (os chamados "encargos especiais). Já se foram R$ 1,5 trilhão. Sobram "apenas" R$ 800 bilhões para assistência social, educação, saúde e custeio da máquina pública, só para ficar nas grandes cifras.
Então, o teto não é só um limite artificial criado por maldade ou insensibilidade social. É uma tentativa de disciplinar despesas sem receita correspondente. Para simplificar, é um dinheiro que não existe. E como se obtém "dinheiro que não existe", como a coluna já explicou? Pedindo emprestado. E quem empresta? O mercado. Se quem troca uma promessa de pagamento com remuneração avalia que a operação tem maior risco, o que faz? Aumenta o custo do empréstimo, que é o juro.