A turbulência provocada pela PEC dos Benefícios, também conhecida pelos apelidos de Kamikaze (por embutir risco de que produza o oposto do que se propõe), Miojo (pela rapidez com que foi preparada) e Eleitoral (atende a população mais pobre, mas só até o final do ano) ultrapassou as fronteiras do Brasil.
No momento que todo o mundo discute medidas para atenuar o impacto da alta dos combustíveis, a receita brasileira foi alvo de análise do Instituto Internacional de Finanças (IIF, na sigla em inglês), com o título "Brazil's Fiscal Easing" (clique aqui para ver o original). Em bom português, algo como "Flexibilização fiscal do Brasil".
Nos cálculos do IIF, o Brasil está gastando mais ou abrindo mão de receita em valor equivalente a 1,25% do PIB (cerca de R$ 100 bilhões). Essa conta considera "todas as medidas aprovadas ou ainda na mesa". A iniciativa ocorre, situa o relatório, "à medida que as eleições se aproximam em meio à alta inflação e descontentamento social".
Não há só más notícias para os brasileiros nessa avaliação. Conforme o instituto, "em 2022, o melhor desempenho da receita pode absorver a maior parte do choque". Mas pondera que a "flexibilização reversa (ou seja, o fim dos benefícios) no próximo ano será um obstáculo significativo para o crescimento, para o qual nem Bolsonaro nem Lula podem estar politicamente preparados".
Isso significa, na visão do IIF, que "o cenário mais provável é que tanto Bolsonaro quanto Lula (quem estiver na Presidência no próximo ano) altere novamente o teto de gastos", porque "desfazer a flexibilização no próximo ano e cumprir o teto de gastos será um empecilho fiscal substancial para o crescimento que um novo governo pode não acolher".
Como especialistas brasileiros em contas públicas têm advertido, o IIF adverte que "as complicações decorrentes da flexibilização contínua surgirão no próximo ano", porque "agora, o superdesempenho da receita é suficiente para absorver o choque sem tirar totalmente dos trilhos os resultados fiscais de 2022". As medidas, prossegue, mudam o impulso fiscal deste ano de contracionista (que reduzem a atividade) para expansionista (que levam a crescimento), "uma escolha conveniente do ponto de vista eleitoral".
Para o IIF, além de "espaço para o 'ruído fiscal' perturbar ainda mais os mercados", a consequência no médio prazo é de que "a situação fiscal do Brasil permanecerá frágil por anos" porque "a redução duradoura da dívida será difícil dada a alta chance de um ajuste fiscal lento".
As tentativas de reduzir o impacto da alta dos combustíveis (9)
1. A PEC dos Benefícios: nascida para baixar tributos sobre combustíveis, virou um "pacote do bem", com aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 e voucher-caminhoneiro de R$ 1 mil. O custo é estimado em R$ 45 bilhões depois que a Câmara desistiu de acrescentar "bondades" que poderiam fazer a conta passar dos R$ 50 bilhões, mas atrasariam a aplicação das medidas, ou seja, reduziriam seu impacto eleitoral. Ainda depende de votação em dois turnos na Câmara, o que deve ocorrer na quinta-feira (7).
2. Aprovada e aplicada em ao menos 21 Estados: teto de 17% a 18% de ICMS para combustíveis, energia, transportes públicos e comunicações. Entrou em vigor em ao menos 21 Estados, incluindo o Rio Grande do Sul.
3. No telhado: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) cogitou mudar a Lei das Estatais, que blinda as empresas públicas de influência política direta. Seria para permitir "sinergia" com o governo. Parece ter sido engavetada, mas há sinais de que só aguarda um momento mais propício para voltar ao debate.
4. A caminho: a troca no conselho e na diretoria da Petrobras é uma tentativa de mudar a política de preços da estatal. Uma assembleia geral de acionistas está marcada para este mês e deve mudar a composição do conselho de administração para abrir caminho a uma mudança na política.
5. Cortina de fumaça: a suposta privatização expressa da Petrobras, nos mesmos moldes da Eletrobras, via capitalização, é considerada a pior das hipóteses, por substituir um monopólio estatal por outro privado. Os preços subiriam em velocidade ainda maior.
A política de preços da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação (PPI), adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto de petróleo cru quanto de derivados, como o diesel. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo — com base no tipo brent, que tem preço definido na bolsa de Londres —, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia que funciona como um seguro contra perdas.