Depois de tantos equívocos, especialmente o ensaio de mudança na Lei das Estatais, o governo Bolsonaro acena agora com duas medidas na direção correta: criar um auxílio-caminhoneiro e aumentar o valor do vale-gás.
Como dizem os ditados, Deus e o diabo moram nos detalhes, então será preciso conhecê-los para saber se o desenho é adequado — o valor cogitado inicialmente para o auxílio-caminhoneiro, de R$ 400, não é suficiente para encher o tanque do caminhão. Mas a orientação é a mais recomendada pela dezena de especialistas que a coluna tem ouvido sobre o tema: gastar dinheiro público com quem realmente precisa.
E há outro importante benefício embutido: seria uma tentativa do ministro da Economia, Paulo Guedes, para evitar que o Congresso discuta alterações na Lei da Estatais, como proposto pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com apoio do presidente Jair Bolsonaro.
Na véspera, a coluna havia perguntado a um profissional envolvido em gestão de estatais se a mudança proposta por Lira deveria ser levada a sério, e a resposta foi "tudo o que vem de Brasília não deve ser desprezado". A coluna indagou, então, se haveria reação, e a resposta foi "total". Isso significa que, a essa altura, ninguém duvida de mais nada. Mas também que não duvidar não quer dizer deixar passar. Se a coluna obteve essas respostas, imagine o que Guedes ouviu e leu depois da cogitação de mudanças na Lei das Estatais.
Os ataques à Petrobras
Ameaça à Lei das Estatais: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) conversou na terça-feira (21) com líderes da Câmara para mudar a Lei das Estatais, que blinda as empresas públicas de influência política direta. Ao defender a medida, Lira disse que um dos objetivos era permitir "sinergia" com o governo. Outra meta seria pavimentar o caminho de Caio Paes de Andrade à presidência da Petrobras. Graduado em Comunicação Social, o atual assessor de Paulo Guedes não tem a experiência requerida pelas regras.
Privatização expressa: em outra iniciativa, o governo estuda fazer uma privatização expressa da Petrobras, sem estudos aprofundados, nos mesmos moldes da Eletrobras, ou seja, via capitalização, simples venda de ações na bolsa. Especialistas que defendem a privatização consideram essa a pior das hipóteses, por substituir um monopólio estatal por outro privado. Uma empresa de petróleo com controle difuso sequer administraria os reajustes, como vez fazendo a Petrobras, que esperou 90 dias para aumentar o preço da gasolina nas refinarias.
Intervenção aberta: a renúncia de José Mauro Coelho à presidência da Petrobras abriu caminho para a intervenção aberta do governo na gestão da empresa. Embora o conselho de administração tenha indicado Fernando Borges para a presidência interina, o plano é indicar Paes de Andrade para a vaga de Coelho no conselho. A partir daí, há duas possibilidades: com Coelho no conselho, tentar indicá-lo para a presidência com aprovação apenas no conselho, encurtando o caminho, ou seguir a liturgia que prevê avaliação no Comitê de Pessoas seguida de convocação de assembleia de acionistas (prazo mínimo é de um mês) para aprovação de oito nomes para o conselho, que então avaliaria a indicação de Paes de Andrade.
A política de preços da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação (PPI), adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto de petróleo cru quanto de derivados, como o diesel. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo — com base no tipo brent, que tem preço definido na bolsa de Londres —, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia que funciona como um seguro contra perdas.