A venda da CEEE-D na manhã desta quarta-feira (31) na bolsa de valores quebra um tabu de mais de duas décadas no Rio Grande do Sul.
Depois da privatização parcial da CEEE e da CRT (para quem nunca ouviu falar, era uma companhia estadual de telefonia) no final da década de 1990, não haviam sido vendidas estatais importantes no Estado. Em boa parte, diga-se de passagem, por problemas na modelagem das realizadas.
Agora, além da última distribuidora de energia estatal do Estado, o governo do Estado planeja vender os outros dois braços do Grupo CEEE, a geradora e a transmissora de eletricidade, além de Sulgás e Corsan. Ainda não está claro o destino da CRM, a mineradora de carvão sobre a qual não se sabe se há interesse privado.
Em entrevista recente — a mesma em que admitiu ter quebrado a promessa de campanha de não abrir mão do controle da estatal de saneamento —, o governador Eduardo Leite disse que a privatização do Banrisul é um "desafio para o próximo governo". Se todas as cinco previstas forem vendidas, o Piratini poderá arrecadar algo em torno de R$ 10 bilhões, mas é preciso lembrar que o Estado tem uma dívida com a União de quase R$ 80 bilhões.
A quebra de tabu foi lembrada pelo novo secretário de Meio Ambiente e Infraestrutura, Luiz Henrique Viana, ao bater o martelo da venda da CEEE-D na B3. Aliás, chamou atenção outra "batida de martelo", a do presidente da CEEE, Marco Soligo: usou força tamanha que chegou a deslocar a base sobre a qual repousa o instrumento simbólico do leilão. O gesto foi explicado por interlocutores do executivo que assumiu o grupo com a missão de vendê-lo: Soligo foi alvo de pressão de intensidade ainda maior nos últimos meses, especialmente da corporação dos eletricitários.
A primeira fissura no tabu ocorreu ainda no governo Sartori, que tomou a decisão de não aportar mais recursos para sustentar a CEEE-D e expor publicamente a situação financeira da estatal. Sartori não conseguiu abrir caminho na Assembleia em junho de 2018, mas preparou o caminho para que Eduardo Leite conseguisse fazê-lo, em maio de 2019, menos de um ano depois.
Em comum, há um personagem, o atual secretário-chefe da Casa Civil, Artur Lemos, que ocupava a pasta de Minas e Energia no governo Sartori e a de Meio Ambiente e Infraestrutura até fevereiro passado. Coube a Lemos abrir o caminho que levou à quebra do tabu nesta quarta-feira (31).
— Fomos muito acusados de entregar a empresas aos chineses. Quem assume a CEEE-D é uma empresa brasileira, do ramo, que vem para ajustar a empresa — desabafou o secretário. — Tenho um sentimento de um árduo trabalho. Não é fácil privatizar empresas neste Brasil. São seis anos de trabalho.
A "acusação" era feita porque a CPFL era considerada favorita para arrematar a CEEE-D. A controladora da empresa que atua em São Paulo é a chinesa State Grid. Mas Lemos esclarece que não tem nada contra o capital chinês. Nem a coluna.
Ao menos uma das companhias que o governo do Estado pretende privatizar neste ano ainda vai enfrentar o peso do quase-ex-tabu: a Corsan. Como não havia intenção de vender o controle, a estatal de saneamento não foi incluída na lista da que tiveram dispensa de plebiscito.
Portanto, Leite vai precisar convencer os deputados, até porque, ao contrário da CEEE-D, a Corsan é uma estatal lucrativa. É verdade que vai precisar fazer um investimento que o governo do Estado não tem como bancar, mas explicar o cenário do marco legal do saneamento não será uma tarefa simples.