A caracterização do governo Bolsonaro como "usina de crises" foi feita pelo presidente
da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ainda na sexta-feira, antes do episódio da demissão do presidente do BNDES, Joaquim Levy. No sábado, o presidente adicionou combustível à produtora de desgastes com a virtual deposição de Levy. A polida carta de renúncia de Levy, em que o já ex-presidente menciona esperar que Guedes, seu fiador no governo "aceda" (concorde), contrasta com a brutalidade com que foi tratado. Mas é
apenas uma fórmula de cortesia.
A certeza da queda de Levy era tanta – como ficar em um cargo depois de ter sua cabeça discutida em praça pública? – que as especulações sobre seu substituto começaram ainda no sábado à tarde. Os mais citados, até agora, são Gustavo Franco, indicado para presidir o conselho de administração do BNDES, e Salim Mattar, secretário de Desestatização do Ministério da Economia.
Podem ser duas apostas óbvias, mas cercadas de dificuldades. Franco é conhecido por seu pavio curto. Uma coisa é estar na presidência do conselho, cercado por pessoas racionais e ponderadas. Outra, é ficar na mira de um governante que se comporta como a Rainha de Copas, personagem de Alice no País das Maravilhas que, diante de discordâncias, gritava: "Cortem-lhe a cabeça!". Fez isso com o general Santos Cruz, na Secretaria-Geral de Governo, e com outro general, Juarez Cunha, presidente dos Correios, demitido em um café da manhã com jornalistas. Mattar tem sob sua responsabilidade um plano de privatizações que só avançou nos casos preparados ainda no governo Temer.
E apesar de Guedes ter afirmado que entende a "angústia" de Bolsonaro diante de "nomes ligados ao PT" na direção do BNDES – Marcos Barbosa Pinto foi diretor na gestão de Demian Fiocca, ligado a Guido Mantega, mas também foi sócio de Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo FH –, o ministro da Economia saiu chamuscado. Ao dizer, dirigindo-se a Levy, "demite esse cara (o recém-nomeado e já demitido diretor de
Mercado de Capitais, Marcos Barbosa Pinto) na segunda ou eu demito você sem passar
pelo Paulo Guedes (ministro da Economia)”, Bolsonaro não só ejetou o presidente do BNDES de sua cadeira, mas deixou bamba a do ministro. Ameaçou passar por cima de seu "posto Ipiranga", a quem prometia consultar em todas as decisões sobre economia.
Quando Levy foi anunciado para ocupar a presidência do BNDES, sua indicação foi recebida com alívio no mercado. Representava um reforço ao núcleo racional do governo Bolsonaro. Sua saída, portanto, representa uma perda nessa área. E com um presidente cada vez mais parecido a personagens pouco equilibrados de ficção, será difícil encontrar quem aceite ocupar uma cadeira da qual poderá ser ejetado em público de forma destemperada.
Em um grupo de debates entre economistas com estofo para ocupar cargos públicos federais, há um consenso: ninguém "respeitável" deveria aceitar a presidência do BNDES, depois da "desconsideração" presidencial. Em um tuíte na noite de sábado, o cientista político Murillo de Aragão, que havia sido cotado para assumir a Embaixada do Brasil em Washington no governo Bolsonaro, observou:
– Existem maneiras e maneiras de demitir. Uma delas é pedir, por meio de um interlocutor, que o digníssimo peça para sair. Seria mais tranquilo para o país e com menos risco para a imagem do governo.
E reforçou, na manhã deste domingo (16):