Uma figura de linguagem usada na quarta-feira (21) para caracterizar o comportamento do mercado pode ser estendida para o momento econômico de todo o país: congelou. Depois da mais forte reação de investidores desde o dia seguinte às primeiras notícias sobre a delação da JBS, bolsa e dólar andaram de lado. Outra forma de descrever o fechamento do Ibovespa em -0,01% e do dólar em -0,03% foi "mercado travado".
Embora longe do pânico que marcou a reação à conversa noturna entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer, a tensão voltou após a derrota do governo no Senado. Os desdobramentos – a acusação do senador Hélio José (PMDB-DF) de que sofreu "retaliação terrível" depois de votar contra o relatório da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) não ajudou.
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Um governo disposto a tudo para sobreviver seria tolerado pelos chamados "agentes econômicos" se entregasse o combinado. A aprovação da reforma trabalhista era considerada uma questão já resolvida, irremediável e inevitável. Talvez ainda seja, mas vai demorar mais.
Se o mercado congelou e travou, o mesmo parece ter acontecido na economia real. Quando empresários que operam na ponta mais sensível do mercado, a do varejo, comentam a reação dos consumidores depois de 17 de maio – a quarta-feira à noite em que foram dadas as primeiras informações sobre a delação da JBS –, relatam que a incipiente reação parou.
Dados de abril surpreenderam positivamente, mas é bom lembrar que o clima ainda não estava contaminado pelo misto de raiva e indignação que se seguiu às revelações. O monitor do PIB do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) saiu nessa quarta com sinais opostos: houve ligeira alta de 0,42% em relação a março e queda forte, de 1,3%, ante abril de 2016.
Enquanto Temer fica na Rússia, o único país comparável em nível de corrupção e de comprometimento dos altos escalões do poder, o Brasil congela. Até agora, não há resultados visíveis. Sua volta não destravará a economia nem descongelará a Justiça. Mas ao menos pode fazer de conta que tenta.