Antes do GPS, os aventureiros que se embretavam em lugares pouco habitados, usavam o Dry Martini para se orientar. Explico para quem não conhece o dispositivo. Os antigos perceberam que, sempre que se fazia este coquetel, aparecia alguém para dizer que a receita estava errada.
Além das constatações óbvias, de que drinques não são uma ciência exata, e que palpiteiros são epidêmicos, perceberam que o efeito colateral poderia ser útil. Então, uma vez perdidos, os viajantes misturavam gin ao Martini até surgir alguém para opinar. Perguntavam ao crítico qual o caminho de volta. Ora, se ele tampouco soubesse, restava manda-lo preparar sua versão. A segunda pessoa surgida, para também criticar, informaria sobre a geografia local.
Esta introdução lembra que os drinques são sempre polêmicos. Já vou me defendendo dos puristas, que creem que caipirinha é cachaça com limão e açúcar. Já os cientistas da Fundação Getúlio Vargas a descrevem como infusão de cachaça com qualquer cítrico. Caipirinha, portanto, é um conceito aberto.
A melhor maneira de suportar nosso longo inverno, que nos distancia da praia, do chope e da caipirinha tradicional, é consumindo a caipirinha de inverno. Ela aquece a alma, protege o corpo e nos faz sonhar com climas melhores. Vamos à receita.
Você precisa de uma lima. Atenção, não é pomelo, toranja ou cidra. É lima mesmo. Usaremos o suco de uma fruta média. Acrescente raspas da casca, para usufruir do óleo que todos os cítricos possuem, e que dão um toque, uma nota acima, do sabor de seu suco.
Junte a um naco de gengibre do tamanho de um polegar. Corte em fatias finas para melhor esmagar. Deixe o suco da lima repousar dentro do gengibre moído. Depois verta duas doses de cachaça.
Sim, com vodka também funciona. Esta bebida é o único destilado nu. Não tem gosto. É água com álcool. Logo, não adiciona sabor. Mas esqueça, queremos algo brasileiro.
Coe e acrescente uma colher de açúcar, para a cachaça reencontrar a doçura perdida na destilação. Pode ser o mascavo, interfere positivamente no sabor, mas deixa a apresentação enferrujada. Decida você. Pode ser algum adoçante desses artificiais radioativos? Pode, mas não fica tão bom.
Em uma taça, acrescente gelo à mistura. Sim, eu sei que estamos no inverno, mas pede uma generosa pedrinha. Aceite e ponha.
Esta bebida traz de volta nossas melhores lembranças veranis e dispara aquela preguiça que amolece os ossos. Ela evoca o calor do sol, o cheiro salgado do mar, os corpos bronzeados do verão, a poesia da beira da praia. Tome ouvindo chorinho, samba ou bossa nova.