São 9h22min da manhã de sexta-feira em Kawasaki. Leandro Damião recém começa o dia. Já se prepara para tomar o caminho do CT do Frontale, numa região vizinha à do condomínio em que mora. Aqui no Brasil, o Inter ainda saía de campo depois de fazer 2 a 0 no Avaí. Na troca de mensagens por WhatsApp, deixo o aviso com o resultado da partida:
— Ainda bem. Na torcida aqui — replica o centroavante.
A distância não separou Damião do Inter. Se o jogo pelo Brasileirão é no domingo, às 16h, as madrugadas são interrompidas para conferir o time. Faz o mesmo com o Flamengo. O Brasileirão é uma forma de manter-se conectado com o lado de cá do mundo, embora a vida no Japão e os dias na tranquila Kawasaki preencham o coração de Damião, da mulher, Nádia, e dos pequenos, Heloísa, cinco anos, e Otávio, três.
O sossego permitiu a Damião manter uma rotina de cidadão comum. Nas primeiras semanas, usava o metrô para se deslocar. Até para os treinos usava transporte público. Os supermercados próximos de casa foram desbravados. Assim como aqueles de produtos brasileiros, embora esses entreguem as compras em casa.
Tranquilidade
Os passeios com a família se tornaram mais frequentes, pelo calendário e pela ausência de concentração. Se o time atua, por exemplo, às 19h, a apresentação é às 16h. Há um lanche, preleção e, depois, a preparação para o jogo. O tratamento respeitoso do fã japonês também colabora para uma vida social mais ativa.
– A segurança que se tem aqui é espetacular. Meus filhos, por exemplo, vão sozinhos para o colégio, em ônibus escolar. A organização do japonês também é algo que impressiona – conta.
Como só há escola internacional em Tóquio, a 40 minutos de Kawasaki, a saída foi matricular os pequenos Heloísa e Otávio numa escola regular japonesa. O que faz com que os dois já arranhem o idioma e tenham criado um círculo de amizades. Damião e a mulher se viram no inglês. Mas o clube disponibilizou um tradutor para ajudar nas questões do dia a dia. Como, por exemplo, no dia em que o centroavante foi fazer a prova para tirar a carteira de habilitação. Foram três etapas vencidas, uma delas escrita, até sair habilitado para dirigir do lado direito.
— Fui aprovado de primeira — orgulha-se Damião.
Em campo, a vida também anda movida por bons ventos. O Frontale é o atual campeão japonês e conta com um grupo formado por jogadores locais mais experientes. Por isso, o técnico Toru Oniki tem rodado o grupo. Damião tem sido mais usado nas copas. São duas, e numa delas – a Levain Cup, que leva para confronto com o campeão da Sul-Americana – o Frontale está na final. Na J-League, o campeonato nacional, o camisa 9 atuou em 19 das 29 rodadas. Fez sete gols – no total, são 12 em 2019.
— O técnico alterna bastante, mas tenho feito gols. O grupo me acolheu, percebeu minha vontade de ajudar. Os japoneses, quando vêem isso no estrangeiro, o abraçam – observa Damião.
Os gols importantes fizeram o centroavante cair nas graças da torcida. Na abertura da temporada, fez o do título da Supercopa, vitória por 1 a 0 sobre o Urawa Red Diamonds. O mais marcante, no entanto, foi o do 1 a 0 em amistoso contra o Chelsea. Ali, viralizou a comemoração do bigode com os dedos – uma homenagem ao pai e sua marca registrada.
Aliás, a ida para o Frontale deu para Damião, também, o orgulho de proporcionar a primeira viagem internacional do pai. Ele atravessou o mundo para ver os netos. E fez com que o Japão ficasse ainda mais acolhedor para Damião. Até 2023, lá será sua casa.