A primeira coisa a ser dita neste texto é que é desonesto culpar o governador pelo caos em que as finanças públicas no RS se encontram. Desonesto culpar Eduardo Leite (PSDB), assim como também o seria responsabilizar o antecessor, José Ivo Sartori (MDB). Há anos a conta despesa x receita não fecha no Estado e, justiça seja feita, ambos apresentaram propostas severas para consolidação de um ajuste fiscal, em busca de - pelo menos - colocar o salário do funcionalismo em dia.
A verdade, que parece óbvia para quem se debruça sobre os números, é que não existe solução mágica. A despesa já foi cortada - por Leite e por Sartori, que aprovaram reformas importantes, reduziram despesas da administração pública e também tentaram fazer com que os demais Poderes fossem partícipes na solução da crise, a partir da discussão sobre o duodécimo.
Esta última ideia, registre-se, foi derrubada na gestão Sartori com o voto da maioria dos deputados. À época, o líder do governo deputado Gabriel Souza (MDB) foi um dos que alertou para a necessidade de aprovação da PEC do duodécimo, com a defesa de que os recursos orçamentários (chamados de duodécimos) destinados aos demais Poderes deveriam ser proporcionais à Recente Corrente Líquida real, e não mais com base no orçamento. Os deputados não ouviram. E a crise seguiu pior.
Contudo, apesar do esforço de ambos os governantes, é importante esclarecer: não bastará reduzir as despesas, o rombo é avassalador. Por ano, o Estado contabiliza R$ 12 bilhões somente em déficit na previdência. Isso mesmo: DOZE BILHÕES. Ou seja, o incremento na receita terá que vir de alguma maneira e o leitor não carece de muito esforço para descobrir quem é que vai pagar a conta. Aliás, sinto em dizer: já estamos pagando. Sem investimento em estradas (o montante hoje é de ínfimo, R$ 150 milhões ao ano), sem um número adequado de profissionais de segurança nas ruas, sem aumento para os funcionários públicos, que nem mesmo recebem dignamente em dia.
Olhemos para a reforma tributária. No novo desenho da proposta, em discussão na Assembleia, as alíquotas do ICMS continuarão majoradas, isso porque caso se encerrassem, Estado e municípios deixariam de contar com R$ 2,8 bilhões a partir de janeiro. Imagine, você, o caos estabelecido em um Estado quebrado que deixasse de contar com esse valor. São duas folhas do funcionalismo, pra dizer o mínimo.
Com o enterro da proposta original - embora absolutamente interessante -, coube ao líder do governo Frederico Antunes a difícil tarefa de encontrar uma solução que trouxesse algum alento às contas públicas. O governo percebeu que o tema era complexo, difícil de ser maturado junto aos parlamentares (e também à sociedade), ainda mais em tempo de pandemia e eleição municipal. Daí a ideia de “transição” que está em jogo, uma espécie de “ponte para atravessar a sanga”, como definiu Antunes à coluna. Isso até que se possa construir e amadurecer juntos uma ideia de reforma tributária, que - repito - é imprescindível ainda que tenha sido adiada.
Aliás, o próprio Leite já havia admitido, em discurso franco na campanha, que não haveria como abrir mão da receita decorrente do ICMS majorado num simples passe de mágica. E, dentro desta perspectiva, afirmara que o caminho seria feito com uma transição gradual. A novidade é que agora, com o enterro da Reforma em andamento, as alíquotas deverão permanecer num período (curto, em tese) porque o rombo decorrente do encerramento do “tarifaço” provocaria o colapso completo dos serviços.
Em suma, o Rio Grande do Sul vai precisar parar de tapar o sol com a peneira e amadurecer a ideia de reformar seu sistema de cobrança de tributos. E essa discussão passa, necessariamente, por discutir retirada de incentivos, impor alíquotas mais duras aos que ganham mais, simplificar cobrança de tributos, entre outros. A medida não é simpática, sabemos, mas tal como a Reforma da Previdência de Jair Bolsonaro terá que ser aprovada, se não agora, num futuro breve.