Como se não bastassem as peripécias contra a Operação Lava-Jato, o procurador-geral da República, Augusto Aras, agora ousa chamar a atenção em um novo um papel: como defensor do governo Jair Bolsonaro. Foi assim nesta quarta-feira, no julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade de dossiê feito pelo Ministério da Justiça a respeito de "funcionários públicos antifascistas".
Cheiro de novo a novidade não tem. Não é a primeira vez que o chefe da PGR age como tal. Cabe lembrar que no distante inquérito que apura se o presidente interferiu na Polícia Federal (acusação que provocou a saída do ex-ministro Sergio Moro, lembram?), Aras se posicionou contra a liberação da íntegra do vídeo da fatídica reunião ministerial. Felizmente, não produziu efeito. O vídeo acabou sendo liberado por decisão do decano do Supremo, ministro Celso de Mello.
Desta vez, o procurador-geral da República não considerou grave a produção de um dossiê contra servidores públicos "antifascistas", que está sob análise no STF. A prática foi rechaçada por uma série de entidades relacionadas à transparência e com apreço pela democracia. E com absoluta razão. Produção secreta de dossiês cheira a arapongagem e remete aos tempos sombrios da ditadura militar. Para o PGR, houve "exagero" nas críticas e não há nada de errado na produção do documento.
- Relatórios de inteligência são comuns e rotineiros - apontou.
Nem o Advogado-Geral da União, que também se manifestou nesta quarta (19), soube defender melhor.
O caso fora mantido em sigilo pelo presidente e pelo Ministério da Justiça, e só veio à tona a partir do trabalho do repórter Rubens Valente, do portal UOL. Mostrou Valente, em 24 de julho, que o o governo havia orquestrado ação sigilosa sobre um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do "movimento antifascismo" e três professores universitários, um dos quais ex-secretário nacional de direitos humanos e atual relator da ONU sobre direitos humanos na Síria. Todos críticos do governo de Jair Bolsonaro.
Diante de tanta atrocidade, um alento: o voto da ministra Carmen Lúcia, relatora da ação no Supremo. Iniciou assim sua fala: "Benza Deus a imprensa livre do meu país". A ministra se referia à nota explicativa do ministro da Justiça, André Mendonça, segundo a qual "só teve conhecimento" da possível existência do relatório de inteligência pela imprensa.
- Benza Deus a imprensa livre do meu país. Benza Deus que temos ainda Judiciário que tem conhecimento disso e que dá importância devida para a garantia da democracia no sentido de a gente verificar do que se trata, do que é e qual a resposta constitucional a ser dada - pontuou.
Em tempos de apreço ao obscurantismo, benza Deus a ministra Carmen Lúcia e sua defesa irretocável da democracia.