Lançada na última sexta-feira, a música "Garra" traz um desabafo frequente entre os brasileiros: o descrédito com a política e os desvios de recursos públicos. A surpresa, no entanto, está na dupla que conduz o chamamento aos cidadãos. O ex-jogador do Grêmio e da seleção brasileira Ronaldinho Gaúcho e o cantor Jorge Vercillo se unem em um dueto que serve também como uma reflexão sobre o "modus operandi" das relações políticas no país. A coluna conversou com Jorge Vercillo sobre o lançamento da canção e os bastidores sobre a real motivação para cantá-la. Leia aqui:
De onde surgiu a vontade de tratar sobre um tema tão complexo em uma música?
Eu precisava como cidadão desabafar, no momento político que vive o nosso no Brasil. Nessa música nós queremos chamar atenção para o sistema político, ou seja, a maneira de se fazer política, que está antiga, obsoleta. Então, “garra” é um canto em relação à cidadania, querendo inspirar no povo a cidadania, para o povo perceber que não adianta essa polarização, essa briga de esquerda e direita, até porque hoje em dia esses conceitos são um pouco relativos.
A música não deixa de ser, então, uma provocação aos cidadãos.
O que a gente quer é inspirar no povo a cidadania, de o povo mesmo sentir que precisa arregaçar as mangas e construir um país mais atual, um modus operandi mais atual de se gerir uma cidade, um Estado, um país. E assim, ajudar quem está eleito ou quem foi eleito, ou até quem vai vir a ser eleito, independente de que partido for, a continuar isso. Porque na verdade esses governantes todos trabalham pra gente, todos eles trabalham pra nós. O povo é o patrão.
Como São Jorge se insere nessa ideia?
Essa música é um canto de cidadania. Usamos o arquétipo de São Jorge como esse santo guerreiro, em defesa do povo brasileiro, em defesa do bom senso.
Como foi o encontro com Ronaldinho Gaúcho? Vocês compactuam das mesmas ideias políticas?
Eu sou muito grato ao Ronaldinho, que foi um cara que teve e tem uma coragem muito grande de cantar esse tema polêmico comigo. O Ronaldinho tem a mesma opinião política que eu. Eu acredito que quando ele tirou a foto com o número 17 atrás, na camisa da seleção brasileira, não foi necessariamente por aprovar todos os atos e pensamentos do nosso atual presidente e então candidato à época (Jair Bolsonaro). Mas, sim, por ver claramente que nos últimos anos nós temos andado por caminhos que não nos levaram a um bom resultado. Esta aí a prova né. A prova de tudo, a nossa economia. Então ele, assim como eu, nós entendemos que a gente precisa de uma reforma geral, na esquerda, na direita, no centro, na maneira de fazer política. Até pra gente parar de ficar “impeachmando” as pessoas que o povo elege.
Quando você fala sobre o sistema político ou o "modus operandi", a que pontos você se refere?
Eu digo, será que todas as pessoas que a gente elege viram cleptomaníacas, viram corruptas, elas se transformam em corruptas da noite para o dia? Eu acho que não. A questão é que o sistema político força qualquer ser humano, seja um político, seja um Dalai Lama, ou um Mahatma Gandhi, se eleito, quem sabe estaria até sem saber, assinando papeis, cometendo desvios de dinheiro, ou tráfico de influência pelas estatais, justamente modus operandi de fazer política. Então esse é o foco que nós temos que ter como grande vilão, não uma pessoa especificamente. Com esse raciocínio, não estou querendo passar a mão na cabeça de ninguém, não. Nem redimir os erros de ninguém. Mas entender que esse sistema, ou o mecanismo, como definiu o diretor José Padsilha, esse mecanismo corrompe, mói, ele tritura quem chega ali dentro para trabalhar, em benefício do próprio sistema que é corrupto.
E qual o papel do cidadão nesse processo?
A gente precisa renovar, descentralizar o Brasil. Então essa música é isso. É um chamado à cidadania. Sem essa coisa de achar que Jesus vai vir ajudar a gente, resolver os problemas do nosso país, que os extraterrestres virão, ou se é um Bolsonaro ou um Lula. O brasileiro tem esse pensamento: é sempre "o outro" que vai vir resolver os problemas dele. O brasileiro sempre coloca que sempre o outro vai vir resolver e nunca ele mesmo. Então é preciso arregaçar as mangas. Somos nós mesmos que temos que fazer.