O jornalista Guilherme Jacques colabora com a colunista Giane Guerra, titular deste espaço.
Há três assuntos que têm dominado a pauta econômica no país nas últimas semanas. O dólar, resistente na casa dos R$ 6 desde o final de novembro; o juro, com a Selic a 12,25% e mais duas altas de um ponto percentual contratadas pelo Banco Central; e a inflação, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 4,83% no último ano, acima do teto da meta.
Entre si, eles se relacionam de forma direta e, se acima das expectativas, afetam toda a sociedade como vem acontecendo. O motivo, segundo o economista da Quantitas João Fernandes, com quem a coluna conversou, é a crise de confiança com o governo.
Como inflação, dólar e juro se relacionam?
Esses três elementos têm um vínculo bem importante entre eles que é confiança. Confiança dos agentes econômicos com o Brasil, na figura do governo. A confiança diminui se o governo não tem capacidade de sustentar o seu funcionamento ao longo do tempo, se não tem dinheiro para arcar com as contas públicas. Quando há despesas em excesso, ele tem que buscar fontes de financiamento, alguém que empreste dinheiro. Se quem empresta confia que o governo vai conseguir pagar, vai cobrar uma taxa de juros mais baixa. Se houver dúvidas, a taxa fica mais alta. Sempre que a confiança fica menor, as taxas sobem não só para emprestar ao governo, mas a qualquer um daquele país. Tem uma outra consequência que essa falta de confiança traz: menos pessoas de fora do país vão estar dispostas a colocar dinheiro aqui. Então, você vai ter menos entrada de moeda, e a principal é o dólar. Com menos dólares, o valor dele aqui sobe. Para finalizar e chegar no último ponto desse tripé, a inflação. Boa parte das coisas que nós consumimos vem de fora, são importadas. Tanto produtos quanto insumos. Então, quando o dólar sobe, o preço para importar sobe também, e nós arcamos com preços maiores. Isso é inflação. Então, a falta de confiança tem como efeito comum aumento da inflação, aumento de juros e aumento do dólar.
A inflação, especialmente, não chega a todos com a mesma intensidade nem ao mesmo tempo.
Exato. Os alimentos são a maior parte da cesta de consumo das populações de faixa de renda menores. Então, para fins sociais é extremamente danosa elevação de preço deles. Na verdade, todos esses espectros, taxa de juros, inflação, dólar, todos eles afetam mais essa população. Quanto mais alta a sua faixa de renda, mais capacidade você tem de se proteger desses movimentos. Se o dólar está subindo, uma pessoa pode comprar dólar, pode mandar o dinheiro lá para fora, por exemplo. Mas os mais pobres, não. E o preço dos alimentos é um dos mais influenciados pela alta do dólar. Em alguns casos, como é o trigo, muito pouco é produzido no Brasil. Então, quando o dólar sobe, o trigo fica mais caro e tudo que deriva dele também. Mas existem outros produtos daqui que também são extremamente afetados. Um exemplo importante desse último ano é a carne bovina. O Brasil exporta para outros países, principalmente para a China. Quando o dólar sobe, começa a ficar mais rentável para quem produz exportar em vez de vender aqui, porque o produto fica melhor remunerado. Isso vai até o ponto em que o preço aqui também sobe e fica equivalente ao que o exportador está ganhando. Já as pessoas, quando não puderem consumir mais por causa dos preços, tentam substituir. Isso leva a um aumento da demanda por outras proteínas, como é o caso da carne de frango e do ovo. Esse aumento de demanda faz o preço desses produtos aumentarem também. É um efeito em cadeia.
Quais sinais o governo precisa dar para recuperar a confiança e em que medida estes sinais funcionam?
Cortar gastos. Não estamos vivendo com um déficit fiscal tão elevado – déficit fiscal é arrecadação do governo menos os seus gastos – porque estamos em um momento muito bom de crescimento da economia. Crescimento alto significa pessoas ganhando maiores salários, empresas lucrando mais e governo arrecadando mais. Isso é bom, mas quando a gente olha para frente, pensa nos próximos anos, se houver uma queda desse crescimento, e isso é plausível porque é difícil um país crescer de forma consistente todos os anos, vai ter uma diminuição da arrecadação desse governo. Só que as despesas não caem quando a arrecadação cai. Neste cenário, o déficit fiscal fica maior e o governo começa a ter que se endividar muito para conseguir cobri-lo. Por isso, tem que conter gastos. Infelizmente o nível de economia que você precisa hoje para fazer essa contenção é maior do que o volume proposto pelo governo de R$ 70 bilhões. E a situação se agrava porque nem esses R$ 70 bilhões, quando você analisa item a item, se avalia que vai ser algo factível de ser alcançado. As estimativas hoje giram em torno de R$ 40 bilhões, R$ 50 bilhões.
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Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br) Com Guilherme Jacques (guilherme.jacques@rdgaucha.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br) Leia aqui outras notícias da coluna