
Há dias em que o roteiro do Brasil parece ter sido escrito por Dias Gomes.
Em mais uma declaração desastrosa, o presidente Lula, ao se referir à Gleisi Hoffmann, afirmou ter escolhido "uma mulher bonita" para comandar a Secretaria de Relações Institucionais do governo, supostamente para diminuir a distância com o Congresso. Como se a fala já não fosse infeliz o suficiente, na mesma ocasião, Lula ainda chamou o líder do governo na Câmara, José Guimarães, de "cabeçudão do Ceará".
Obviamente, a oposição recebeu a declaração em baixela de prata, como munição política de alto calibre. Primeiro porque se essa mesma frase tivesse sido dita por Jair Bolsonaro, PSOL e PT já teriam protocolado pelo menos 18 pedidos de impeachment no Congresso, deputados marchariam de mãos dadas ao STF pedindo pela sua prisão e até uma denúncia formal no Tribunal de Haia já teria sido iniciada.
Segundo, porque todo mundo sabe que a escolha de Gleisi Hoffmann não se deu por razões estéticas, e sim porque seu antecessor fracassou na função. Ela caiu nas graças do Centrão ao apoiar, sem hesitação, a candidatura de Hugo Motta à presidência da Câmara enquanto o próprio Lula ainda vacilava sobre o apoio. O respaldo dos caciques do Centrão, no entanto, não é exatamente um mérito. Gleisi é vista como radical, intransigente e autoritária, e trata como "fascista" qualquer um que não se submeta ao petismo fanático. Justamente ela é quem está agora à frente da pasta responsável pelo diálogo entre Planalto e Congresso. Ainda assim, a expectativa de governistas e opositores é que, ao menos, faça um trabalho mais eficaz do que o seu antecessor
Mas a questão central aqui não é a indicação, e sim o evidente descompasso de Lula com a sociedade que o elegeu. O presidente não é mais o mesmo de seus dois primeiros mandatos. Ele se encontra radicalizado, isolado e alheio aos anseios do eleitorado que lhe garantiu a vitória apertada contra Bolsonaro em 2022. Parece ter esquecido que venceu por uma diferença microscópica, mesmo competindo contra um adversário que fez de tudo para não se reeleger.
Lula só venceu porque se formou uma frente ampla de eleitores que, mesmo sem simpatia por ele, temiam um mal maior. E agora, o reflexo de sua soberba está cada vez mais evidente. A popularidade do governo despenca, o PT amargou um desempenho vergonhoso nas eleições municipais do ano passado e, enquanto as pessoas fazem contas na hora de ir ao supermercado, deixando de comprar azeite, carne e café, o governo busca melhorar sua imagem com medidas vazias.
De nada adianta trocar o ministro das Comunicações se o problema de comunicação está sentado no gabinete presidencial, no terceiro andar do Palácio do Planalto.