Sob a penumbra umbrosa e o ar mortiço, o templo que deveria ser sagrado na verdade exala um clima profano. Foi erguido para celebrar a vida, mas mais parece uma exaltação à morte insepulta, dia após dia, há quase um século. Um facho de luz baça se projeta do teto, transpassa o sarcófago de vidro e então alumbra a face severa e pétrea do falecido. É um rosto macilento de cera – ou uma máscara mortuária de carne –, mais inquisidor do que tenebroso. Quase esfinge em vez de múmia, a propor, em silêncio mortal, o enigma às avessas: “Devora-me ou te decifro”.
A múmia
Ninguém jamais ousou devorar Lênin
Líder da maior revolução social de todos os tempos permanece até hoje em praça pública, mumificado feito um faraó de araque
Eduardo Bueno
Direto de Moscou