
Os velhos que vivem no Japão de hoje seremos nós amanhã. Lá, 35% da população tem mais de 65 anos.
Como lidar com uma sociedade com baixas taxas de natalidade, na qual dois trabalhadores ficarão responsáveis por sustentar um aposentado? Os mais jovens terão como cuidar do familiar que se tornou incapaz de realizar as tarefas cotidianas? Que políticas públicas devem ser implementadas para enfrentar um problema de tal magnitude?
Esse cenário explica por que os japoneses publicam tantos estudos sobre os diferentes aspectos do envelhecimento: das pesquisas laboratoriais à construção de modelos epidemiológicos que permitam fazer previsões para a economia do país.
Disparidades geográficas
As publicações científicas mostram que o aumento continuado da expectativa de vida dos japoneses se aproximou de um platô nas três últimas décadas. Ao mesmo tempo, a disparidade numérica entre as diferentes regiões geográficas do país continua a se alargar.
Esse fenômeno se repete no mundo inteiro. A expectativa média de vida em Santa Catarina é significativamente maior do que no Acre. Em bairros da mesma cidade, ela pode variar tanto que os epidemiologistas a consideram CEP-dependente. Em São Paulo, por exemplo, pode chegar a 80 anos em Moema (bairro de classe média alta), enquanto mal atinge 65 na periferia mais pobre.
Há duas abordagens científicas para essa questão: a primeira é a da "compressão da morbidade", que se baseia em promover estilos de vida, condições e hábitos mais saudáveis, de modo que os agravos à saúde sejam "comprimidos" para as fases mais tardias da velhice.
Quando morre um familiar de 70 anos, dizemos que morreu moço
A outra hipótese é a da "expansão da morbidade", segundo a qual os tratamentos disponíveis podem melhorar continuamente a saúde dos que já apresentam problemas médicos.
A estratégia de estimular atividades preventivas, como a alimentação saudável e a atividade física praticada com regularidade, tem sido chamada de "sucesso do sucesso", enquanto a outra é considerada "fracasso do sucesso".
Adotada nos Estados Unidos, esta última é a responsável pelos quase US$ 4 trilhões que os norte-americanos investem em saúde — número maior do que o PIB do Brasil —, em contradição com uma expectativa média de vida de apenas 78 anos, a mais baixa entre os países da OCDE.
Envelhecemos mal
No Brasil, o fenômeno do envelhecimento da população acompanha a tendência mundial. Quando nasci, a expectativa de vida mal chegava a 50 anos. Hoje, quando morre um familiar de 70 anos, dizemos que morreu moço.
Envelhecemos mal, entretanto: pelo menos a metade das mulheres e dos homens chega aos 60 anos com hipertensão arterial. O número de pessoas com diabetes deve andar na casa dos 20 milhões. Sem contar os que estão nas ruas com 15 ou 16 por 10 de pressão e glicemias acima de 126 sem suspeitar das complicações à espreita.
Quando o SUS foi criado, depois da Constituição de 1988, vivíamos num Brasil bem mais jovem. Embora ainda enfrentássemos o cortejo de endemias rurais, o grosso dos atendimentos eram as doenças agudas: infecções respiratórias, fraturas ósseas, gastroenterites e outros agravos passíveis de cura a baixo custo para o sistema de saúde.
Hoje, cerca de 80% dos atendimentos do SUS e da Saúde Suplementar (planos de saúde) é de problemas crônicos: enfermidades cardiovasculares, pulmonares, renais, degenerações neurológicas e muitas outras. Agora, lidamos com casos em que o objetivo do atendimento não é a cura, mas o controle da condição para o resto da vida.
Prevenção é a única saída
Com o envelhecimento progressivo dos brasileiros e a incorporação de novas tecnologias, os custos se tornaram proibitivos. A prova é que apesar de a maioria da população sonhar com um plano de saúde, o número dos que conseguem obtê-lo oscila em torno de 50 milhões há pelo menos 10 anos — apesar do aumento do número de habitantes.
Como não podemos deter o envelhecimento nem negar acesso à tecnologia, só nos resta uma saída: prevenção. Todos os esforços devem ser empregados para evitar que as pessoas adoeçam.
Formado em Medicina no fim dos anos 1960, quando nossos desafios eram esquistossomose, Chagas, verminoses, malária, subnutrição, diarreias e desidratação, eu nunca poderia imaginar que 50 anos depois a principal mensagem de saúde pública fosse: "Não dá para passar os dias sentado comendo tudo o que te oferecem".