Pergunte a qualquer ginete que já levou o Freio de Ouro para casa o quê é fundamental para vencer no campo de provas em Esteio e a resposta será a mesma: humildade e empenho. A afirmativa é autêntica, mas é só meia verdade. A receita também exige preparo físico, habilidade, disciplina, treinos diários, capacidade de improviso e o aquilo que os campeões têm: um pouco de sorte.

Freio de Ouro promete disputa acirrada na estreia da cidade crioula
Saiba quem são os 106 conjuntos finalistas do Freio de Ouro em 2015
Raça crioula projeta repetir quase R$ 200 milhões em negócios em 2015
Leia as últimas notícias de Campo e Lavoura
Assim como os animais que disputam o título mais importante da raça crioula, a rotina dos ginetes nas semanas que antecedem as provas é semelhante à de atletas de alto rendimento. Treino duas vezes por dia, exercícios para melhorar o condicionamento muscular do animal e preocupação em aperfeiçoar os detalhes de cada movimento do cavalo.
O afeto com a montaria é perceptível, mas a relação é essencialmente profissional. Um mesmo ginete pode competir com diferentes animais de donos distintos, e é dever dele garantir que todos cheguem com as mesmas chances.
A maioria dos animais é enviada a centros de treinamentos com cerca de dois anos e meio de vida, depois da doma (processo que o amansa e deixa apto a ser treinado). Lá, são avaliados entre 30 e 60 dias para identificar se têm chances de disputar o título. A partir daí, são meses de trabalho, com ensinamentos e repetições de movimentos até absorverem comandos mais complexos.
- Todos os dias há repetição, correções e agrados. É um trabalho de disciplina e precisão até o cavalo chegar aos cinco anos adulto e capaz de disputar o título. Só há folga um dia, no fim de semana - explica o técnico da Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC) Rafael Sant'Anna.
Em caso de vitória, a valorização do animal é astronômica. Um exemplo é o Destaque da Maior, atual campeão entre os machos, cujo valor subiu 10 vezes em dois anos, chegando a R$ 2,5 milhões.
Para saber mais sobre a rotina dos ginetes, ZH ouviu o maior campeão do Freio e os atuais vencedores entre machos e fêmeas. Guto Freire, que venceu no ano passado com o Destaque da Maior entre os machos, chega a Esteio com 11 animais classificados. Às vésperas da disputa, empenha-se em refinar os movimentos de cada competidor. E a prova mais complexa?
- Aquela em que o animal tem mais dificuldade. Sei a aptidão de cada um e me exijo mais por isso - afirma.
Evolução técnica constante
Um bom ginete não conquista a vitória sem um bom animal. E um cavalo, por mais habilidoso que seja, não vence sem guia de alto nível. Por ser uma das provas equestres que imita a lida no campo, o Freio exige ligação singular entre montador e montaria.
Natural de Passo Fundo, 34 anos, tem três títulos no Freio de Ouro. Neste ano, classificou 11 animais para a grande final (Foto Mateus Bruxel, Agência RBS)

Nos últimos anos, a competição tem se acirrado. Até 1994, a maioria dos montadores trabalhava nas cabanhas, usando técnicas tradicionais, aprendidas com pais e avós.
- Depois disso, os ginetes passaram a adaptar técnicas americanas aos costumes locais, e o nível de exigência para chegar às finais subiu - conta Guto.
O ginete disputa provas desde 1996. Foram seis anos de trabalho até credenciar o primeiro animal e mais seis para chegar à final, onde é presença constante desde 2008, sempre evoluindo:
- Uma vez treinei um animal e não o credenciei para a competição. Um tempo depois, outro treinador conseguiu. Era o mesmo animal. A partir dali, aprendi como o meu papel é importante. Se não venço, a responsabilidade não é do gado, da pista ou da chuva. É minha. E me esforço para fazer o melhor.
O Schumacher de Camaquã
Natural de Camaquã, Milton Castro tem 45 anos e sete títulos no Freio de Ouro. Neste ano, classificou dois animais à final (Foto Mateus Bruxel, Agência RBS)

Fosse o Freio de Ouro um campeonato de Fórmula-1, Milton Castro seria Michael Schumacher. Maior vencedor da história, o ginete coleciona sete títulos - o mesmo número de conquistas do piloto. Por coincidência, o primeiro deles veio em 1994, quando o alemão ganhou pela primeira vez.
Com 45 anos, um a menos que Schumacher, Castro mostra que não há limite de idade para ser um bom ginete. Hoje veterano na disputa, venceu com apenas 24 anos e garante: a experiência só ajuda.
Natural de Camaquã, ele convive diariamente com cavalos crioulos desde os quatro anos e doma desde os 10. Com o nível da competição crescendo a cada ano, a necessidade de aprimoramento também aumenta. Além do treino diário com os animais, o ginete conta que passa por um período de "concentração" antes da prova.
- É difícil, não dá para errar nada. Precisa estar com boa saúde e controle dos nervos. Por isso, é importante focar no cavalo para transmitir a segurança necessária. A vitória, quando vem, pertence metade ao cavalo, metade ao ginete. É uma parceria - ensina.
A prática no campo, aprendida com o pai há 30 anos, agora é repassada ao filho Juliano, 22 anos. O guri já participou de algumas competições e sonha vencer o Freio de Ouro, assim como o pai.
- A conquista é resultado de muito trabalho. É seguir se esforçando que a vitória chega - diz Castro.
Experiência na juventude
Natural de Cachoeira do Sul, Rau Lima tem 29 anos e um título do Freio de Ouro, conquistado em 2014. Neste ano, classificou sete animais para a final (Foto Mateus Bruxel, Agência RBS)

Após uma final eletrizante no ano passado, decidida na última paleteada, o ginete Raul Lima garante estar pronto para buscar o inédito bicampeonato. Vencedor em 2014 entre as fêmeas, com a Jotace Tranca, o ginete natural de Cachoeira do Sul vem treinando duas vezes por dia.
- O nível das provas tem melhorado cada vez mais nos últimos tempos. Há muita gente nova e talentosa chegando - conta.
Lima sabe bem do que está falando. Entre os vencedores, ele mesmo pode ser considerado um "novato" na prova. Mesmo tendo sido "criado entre os cavalos", como gosta de dizer, o ginete de 29 anos foi participar pela primeira vez de uma credenciadora em 2007.
Em uma disputa na qual a experiência pesa a favor dos ginetes, em apenas sete anos conseguiu chegar ao lugar mais alto do pódio.
O sonho de se tornar um campeão do Freio de Ouro surgiu da época em que acompanhava outros ginetes vencedores da competição, como Laurindo Affonso e Vilson Souza. Das lições aprendidas, ele elenca como mais importantes a dedicação ao treinamento, a capacidade de improviso na hora da disputa e a paciência:
- Às vezes, o animal vai muito bem em todos os treinos, mas não repete na hora da prova. Acontece. Ou, ao contrário, chega na pista e tem um desempenho acima da média. Trabalhar com doma exige tempo e, acima de tudo, disposição. Estar preparado para o acerto e para o erro do cavalo.