Pelo menos 60% de toda a chuvarada que inundou o Rio Grande do Sul no começo do mês não foi absorvida pelo solo e deixou marcas de destruição em lavouras do Norte e Noroeste gaúcho. As perdas são medidas em dois níveis: a invasão das águas em pastagens e a enxurrada que provocou erosão em áreas cultivadas com trigo.
Leia todas as últimas notícias de Zero Hora
- Ainda estamos avaliando os prejuízos. Mas sabe-se que a erosão arrasta sementes e nutrientes do solo, como fertilizantes e corretivos já aplicados - diz Gervásio Paulus, diretor-técnico da Emater
Em regiões onde 300 milímetros de chuva seriam suficientes para todo o ciclo do trigo, por exemplo, o volume foi registrado em três dias. A água que não foi absorvida pela terra provocou erosão até mesmo em áreas de plantio direto, normalmente mais resistentes a esse tipo de dano.
Agora, com os estragos feitos, produtores tentam recuperar a fertilidade do solo reaplicando fertilizantes e calcário. Com 500 hectares de trigo semeados no período das precipitações, a produtora Antônia da Silva Polo teve de recalcular os custos da lavoura em Santo Augusto. Na área afetada, o gerente técnico Eduardo Benetti teve de refazer o manejo e a adubação nos últimos dias, aumentando em 20% o custo previsto.
- Perdemos quase 80% do nitrogênio pelo encharcamento do solo. Não lembro de ter visto prejuízo tão grande nas lavouras de inverno - disse Benetti, 38 anos.
Além dos nutrientes que levou do solo, a chuvarada provocou atrasos no plantio. Cerca de 500 hectares ainda não terminaram de ser semeados e, mesmo com a ampliação do zoneamento agrícola até 31 de julho, há quem preveja problema na colheita tardia.
- É um risco maior. O trigo ainda estará em desenvolvimento no período de chuva, em setembro e outubro - completa Benetti.
O atraso também fez produtores desistirem do cereal para não comprometer o milho e a soja plantada no cedo, o que pode ter reflexo na área prevista para o trigo na safra 2014/2015, de 1,1 milhão de hectares. Conforme a Emater, o plantio foi concluído em 79% das lavouras gaúchas. No mesmo período de 2013 o percentual era de 86%.
O impacto da chuva se deu, ainda, nas pastagens, reduzindo o peso dos animais e a produção de leite. Com menos forrageiras, a alimentação do gado teve de ser suplementada com ração.
Soja e milho podem ter a produção beneficiada
Embora ainda não se tenha comprovação de que as precipitações na Região Sul sejam reflexo do El Niño, há influência do fenômeno para este ano - o que pode ser outro complicador para a safra de inverno. O período em que há maior impacto costuma ser na primavera, justamente quando as culturas estarão no período de enchimento de grãos ou prontas para serem colhidas.
- A influência vai depender de como o fenômeno irá atuar e em quais regiões. A partir de agora teremos modelos mais eficientes para prever isso - explica Glauco Freitas, meteorologista da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro).
Conforme Freitas, o primeiro sinal do fenômeno é o aumento da temperatura do oceano Pacífico equatorial. Apesar da tendência de as culturas de inverno serem impactadas negativamente com as precipitações previstas para o Sul nos próximos meses, as safras de soja e milho, no verão, podem ser beneficiadas.
- Enquanto uma cultura perde, outra pode ganhar. Isso tudo dependerá da forma que o El Niño atuará - diz o meterologista.