Por Marcelo Dutra da Silva
Ecólogo, professor da Furg
Vivemos um momento transformador, e as mudanças se mostrarão por toda parte. Nunca houve um caminho de oportunidades tão recheado de boas expectativas, e o Brasil está no centro disso tudo. A nova economia é verde, com as garantias de bem-estar social consignadas a uma espécie de nova agenda de relacionamento humano com a natureza. Afinal, somos produto do meio e desempenhamos um papel fundamental nas decisões que alteram o meio e a forma pela qual vamos ser transformados por ele. Ou seja, somos a resposta para qualquer mudança. E o mercado sinaliza que essa mudança chegou para ficar. Todos querem ser ESG, a sigla de apenas três letras que está revolucionando o ambiente de negócios. Não se fala em outra coisa, e por onde passo sempre tem alguém que pergunta: “O que é esse tal de ESG?”. É a estratégia que reúne boas práticas de gestão, responsabilidade socioambiental e metas de sustentabilidade para reduzir o risco financeiro do investimento de empresas e corporações.
O ESG (“environmental, social and corporate governance”) não é algo exatamente novo e está mais para uma forma moderna de abordagem, que remete ao modelo de sociedade que passamos a construir a partir da Revolução Industrial. Foram os grandes desastres industriais da história que despertam a atenção do mundo financeiro quanto aos impactos da poluição na vida das pessoas, às mortes no ambiente de trabalho, aos escândalos e toda sorte de prejuízos, com o fechamento de companhias e a rápida evaporação dos investimentos. O melhor exemplo é o livro da bióloga americana Rachel Carson, Primavera Silenciosa, publicado em 1948, que destacou os problemas associados ao uso de agrotóxicos e seus efeitos no ambiente e na saúde das pessoas. A indústria de químicos foi exposta e enfrentou a primeira crise de desconfiança, com declínios, fechamentos e a proibição do uso do dicloro-difenil-tricloroetano (DDT) nos Estados Unidos.
O livro de Carson caiu como uma bomba na sociedade, que já vinha discutindo os efeitos da industrialização e as formas de melhorar o controle. Foi o princípio de uma grande mobilização global, marcada pela primeira conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (1972), em Estocolmo. Em seguida, pela criação da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, durante a Assembleia Geral da ONU (1983), presidida por Gro Harlem Brundtland, primeira-ministra da Noruega, responsável pelo relatório Nosso Futuro Comum (1985).
Foi nesse relatório que a expressão desenvolvimento sustentável foi empregada pela primeira vez. No mesmo ano, foi realizada em Viena, na Itália, a convenção para a proteção da camada de ozônio, que culminou com o protocolo de Montreal – único protocolo ambiental multilateral assinado por 197 países. E daí em diante uma série de encontros, cúpulas, tratados e acordos foram sendo definidos e realizados, como a COP27, que acabou de ocorrer no Egito, para discutir questões climáticas e políticas de redução das emissões de gases do efeito estufa.
A princípio, dois modelos teóricos definiram o que mais tarde ficou conhecido como a cultura ESG. A teoria dos stakeholders (1984), na qual Edward Freeman sustenta que empresas não podem fazer o que querem sem avaliar as consequências de seus atos, e o chamado triple bottom line de John Elkington (1994), conhecido como o pai da sustentabilidade com sua teoria do tripé sociedade, meio ambiente e economia, que abrange o conceito da gestão sustentável, segundo o qual companhias devem considerar os efeitos na sociedade e os impactos na natureza. Mas a sigla surgiu só 10 anos mais tarde, na publicação do Pacto Global em parceria com o Banco Mundial, chamada Who Cares Wins, a partir de uma provocação do secretário-geral da ONU Kofi Annan dirigida a 50 CEOs de grandes instituições financeiras sobre como integrar fatores sociais, ambientais e de governança no mercado de capitais. Desde então, o sistema financeiro nunca mais foi o mesmo, e vem mudando rapidamente.
O ESG tornou-se a sigla do mercado responsável, que até há pouco tempo operava pela ideia do investimento responsável, mas que acaba de ganhar novos contornos. O que parecia ser algo exclusivo das grandes empresas e corporações começa ganhar importância de empresas menores e entra no radar de médias, pequenas e até microempresas, pois as grandes têm forte relacionamento com as companhias menores, e os princípios do ESG exigem uma forma de relacionamento em que os parceiros de negócio também sigam boas práticas de interesse social e ambiental. Do contrário, todos podem sair perdendo, pois a agenda ESG começa a ser fortemente cobrada em operações de seguro e empréstimos bancários. O que leva a entender que a sustentabilidade do ambiente de negócios depende de quanta atenção a organização dispensa para os riscos associados a mudanças climáticas, desastres ambientais, origem e procedência dos insumos, segurança no ambiente de trabalho, reputação e imagem dos empreendimentos, multas e embargos nas operações, além de toda sorte de certificações, selos e objetivos para o desenvolvimento sustentável adotados pela organização para se enquadrar nos objetivos do desenvolvimento sustentável (ODSs da ONU), para afastar estes riscos. E quem não perceber isso ficará para trás, no lugar dos dinossauros.