Em uma postagem em suas redes sociais nesta terça-feira (7), Mark Zuckerberg, CEO da Meta, que é dona do Facebook e Instagram, anunciou que as plataformas deixarão de contar com sistema de checagem de fatos. O modelo que passará a ser adotado é o de "notas de comunidade", semelhante ao X, de Elon Musk. Com isso, não haverá mais o trabalho por profissionais de verificação das informações falsas publicadas nas redes da empresa. Eram eles que colocavam avisos e reduziam o alcance das postagens.
Para Zuckerberg, a mudança busca restaurar a "liberdade de expressão" e que os verificadores, desde que foram implementados, têm sido "muito parciais politicamente" e que "destruíram mais confiança do que construíram, especialmente nos Estados Unidos".
Por isso, ele começará as mudanças pelo país norte-americano, em um alinhamento com o futuro governo de Donald Trump, mas não deu detalhes sobre a implementação em outros territórios. Na declaração, Zuckerberg afirmou que o método tem falhas e, mesmo que eles compreendam a apenas 1% dos posts, isto representa "milhões de pessoas" afetadas.
— E chegamos a um ponto em que são apenas muitos erros e muita censura — disse o criador do Facebook. — Agora, temos a oportunidade de restaurar a liberdade de expressão, e estou animado para fazer isso. Vai levar tempo para acertar. Estes são sistemas complexos e nunca serão perfeitos.
Mas, afinal, o que muda para o usuário final este tipo de alteração? No formato anunciado pela Meta, a moderação de conteúdo será realizada pelos próprios usuários, que podem adicionar notas explicativas às publicações. Já com o sistema de checagem, agências de verificação de fatos auxiliavam na moderação de postagens que violassem os termos de uso — como espalhar fake news sobre política ou saúde. Há organizações como essas em diferentes países, dedicadas à analisar detalhadamente acontecimentos, dados e versões. Também havia uma equipe interna dedicada a essa função.
Ao g1, a Meta enviou comunicado do vice-presidente de assuntos globais da companhia, Joel Kaplan, confirmando as mudanças anunciadas pelo seu CEO e reforçando: "Permitiremos que as pessoas se expressem mais, eliminando restrições sobre alguns assuntos que são parte de discussões na sociedade e focando a moderação de conteúdo em postagens ilegais e violações de alta severidade".
Para André Pase, professor e pesquisador de Comunicação Digital da Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS), a medida adotada por Zuckerberg reforça que as redes sociais transitam pela brecha de que, juridicamente, são empresas de tecnologia e não de mídia. E isto as exime de diversas responsabilidades:
— Na fala do Zuckerberg, tem uma hora que ele diz que vai colocar mais conteúdo cívico. É uma aposta em conteúdo que engaja. Mas, se engaja para o bem ou para o mal, é uma outra conversa. E o conteúdo que engaja rende dores e amores das pessoas, que vão para as suas plataformas para falar e, infelizmente, para brigar, discutir. Só que isso, no final das contas, é engajamento. E é o que ele precisa, é o motor da empresa Meta — pontua o professor, que pesquisa temáticas como tecnologias na comunicação.
Raquel Recuero, professora e pesquisadora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da UFRGS, enxerga este movimento como "incompreensível". Ela aponta que o próprio Zuckerberg adotou as verificações em 2016, dando espaço para agências do mundo inteiro no controle de desinformação — importantes no processo eleitoral e, até mesmo, no recente combate às notícias falsas sobre vacinação.
— Foi uma pedrada. Ele começa falando que a checagem é tendenciosa, cuspindo no prato em que comeu. Acho que é uma questão extremamente problemática, porque, como a gente está vendo no X, este outro método de checagem que eles querem usar com os usuários não funciona muito bem. É demorado e nem sempre traz respostas. Afinal, são pessoas que não são pagas para isso. Me parece isso que vai tornar essas ferramentas novamente um espaço muito propício para desinformação, para discurso de ódio, para essas coisas que a gente tem tentado combater no mundo todo.
Na prática
A pesquisadora, que estuda a desinformação nas redes, aponta que, com a retirada dos verificadores, o usuário das plataformas vai ficar mais confuso. Apesar dos problemas encontrados na Meta, a marca d'água alertando sobre conteúdo falso em determinadas postagens "desencorajava" o compartilhamento. Afinal, uma equipe de checadores profissionais debateu o conteúdo.
— Essas estratégias tinham, sim, uma eficácia. Talvez não fosse a maior eficácia do mundo, mas já ajudava. Então, a gente vai perder o pouco de ajuda que se tinha — detalha Raquel, destacando que o jornalista verifica se aquilo realmente aconteceu. — Ela (a comunidade) não vai ser processada se propagar uma notícia falsa. E aí eu acho que entra uma outra questão, que é a fuga das plataformas da responsabilização por promover uma infraestrutura que prejudica o debate público.
Conforme os especialistas, a partir desta mudança fica ainda mais importante a procura por fontes confiáveis ao se deparar com postagens suspeitas nas redes sociais. É importante ressaltar que o algoritmo vai entregar, cada vez mais, o conteúdo que o usuário quer ver, que se alinha com o seu discurso, o que pode lhe tirar o senso crítico e a desconfiança sobre tal publicação.
— A desinformação é uma epidemia moderna. Isto é um fato. E gosto sempre de pensar que as agências de checagem de fatos são muito necessárias no mundo de hoje. Mas, muitas vezes, elas não conseguem chegar na pessoa que deveriam. Aquela pessoa que viu uma coisa que não era bem aquilo e, de repente, repassou — detalha Pase.
Sobre conteúdos de ódio, o pesquisador da PUCRS ressalta que, mesmo antes, com os verificadores, as redes sociais da Meta já abrigavam publicações do tipo. Agora, o novo posicionamento da empresa deverá deixar estas publicações chegarem com mais facilidade ao grande público:
— A mudança não é imediata, mas ela vai acontecer. Não é uma coisa tipo assim: abriu o Facebook e, hoje, mudou. Mas, agora, a gente tem o posicionamento da empresa a partir do que vem aqui pela frente.
Em comunicado, Zuckerberg, mostrou alinhamento com o presidente Donald Trump para "resistir a governos ao redor do mundo", que estão "perseguindo empresas americanas e pressionando por mais censura".