Cientistas localizaram uma região do cérebro que está relacionada ao ato de caminhar em pacientes com Parkinson. A descoberta abre uma janela para intervenções mais precisas nessas áreas, incluindo as chamadas estimulações cerebrais não invasivas.
O trabalho foi conduzido pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), em parceria com um colega do Departamento de Materiais e Produção da Aalborg University (Dinamarca). A pesquisa foi publicada na revista Sensors.
Para chegar aos resultados, os cientistas montaram um experimento com 29 adultos de 70 anos, sendo 14 saudáveis (cinco homens e nove mulheres) e 15 com Parkinson (seis homens e nove mulheres). Os participantes foram recrutados no banco de dados do Laboratório de Estudos da Postura e da Locomoção da Unesp, no campus de Rio Claro.
Os pacientes foram selecionados com base no diagnóstico confirmado de doença de Parkinson por pelo menos um neurologista. Ambos os grupos deveriam conseguir andar sem ajuda e residir na comunidade.
— Pedimos aos participantes para que andassem em torno de um circuito oval sobre um tapete com sensor de pressão que fazia o registro do caminhar. Assim, quantificamos o padrão do andar das pessoas, porque sabemos que, nos indivíduos com Parkinson, ele é alterado: eles andam mais devagar, com passos mais curtos — explica o Doutor em Ciências da Motricidade, Rodrigo Vitório, um dos autores do artigo.
Por meio de eletroencefalografia feita com 64 eletrodos, foi registrada a atividade elétrica que chega ao nível do escalpo em cada um dos participantes durante a caminhada. São milhares de neurônios em atividade elétrica que ultrapassa tecidos e ossos, conseguindo ser registrada pelos eletrodos.
— O registro é uma mistura de frequências. Há ondas cerebrais mais lentas e mais rápidas. De acordo com as medidas que fazemos desses sinais, sabemos quão forte é cada frequência. Ao quantificar a força dessas frequências, conseguimos comparar as pessoas com e sem Parkinson para ver se existe alguma alteração relacionada à doença — comenta.
O cientista lembra que, em um estudo anterior, o grupo já havia feito medidas parecidas, mas com um sistema de 32 eletrodos. Naquele momento, a conclusão foi que pacientes com Parkinson tinham menor proporção de ondas rápidas, mas não conseguiram localizar, no cérebro, de onde os sinais estavam vindo.
Eles também confirmaram que a ingestão do remédio dopaminérgica (que aumenta a atividade relacionada à dopamina no cérebro) sobe a atividade da frequência rápida e também o comprimento do passo.
Baixa frequência
O estudo mais recente, com 64 canais, possibilitou chegar à fonte dos sinais cerebrais emitidos com auxílio de algoritmos de modelagem. Os cientistas fizeram a decomposição do que foi medido na eletroencefalografia para limpar os dados e remover os chamados artefatos (como piscadas de olhos, atividade muscular e outras relacionadas ao movimento).
— Localizamos apenas os componentes cerebrais e, com base na localização, fizemos um agrupamento por cluster. Depois disso, calculamos as diferentes frequências do sinal, com base nos componentes cerebrais localizados na mesma região, e só então comparamos os dados dos dois grupos — Vitório seguiu a explicação.
Nas medidas absolutas, os cientistas não viram diferença entre os grupos com e sem a doença de Parkinson. Mas, quando fizeram a razão entre ondas lentas e ondas rápidas, a diferença apareceu: o córtex cerebral estaria funcionando mais lentamente.
Vitório esclarece que, na doença de Parkinson, os neurônios que produzem dopamina estão morrendo, o que reduz a quantidade do neurotransmissor disponível. A morte dessas células provoca um conjunto de alterações na sinalização e todas as saídas dos núcleos da base para outras partes do cérebro se alteram. A principal alteração é um aumento da atividade inibitória sobre outras áreas, incluindo o tálamo.
— Como o tálamo está superinibido, a atividade excitatória que volta de lá para o córtex cerebral é diminuída, alterando o padrão de atividade do córtex cerebral. E isso pode explicar o resultado que observamos: pacientes com Parkinson apresentaram maior proporção de ondas lentas no córtex sensório-motor — explica.
O grupo de autores propõe que essa medida (a razão entre frequências mais lentas e mais rápidas) talvez possa ser usada como marcador para monitorar o tratamento de pessoas com Parkinson e até as respostas ao tratamento farmacológico.
— Há pacientes que não respondem à medicação, tanto levando-se em conta a atividade cerebral, quanto o comprimento do passo. Essa medida que encontramos pode ser uma forma de monitorar a resposta ao tratamento: se o paciente não apresenta melhora, talvez seja porque, fisiologicamente, o cérebro não está respondendo ao fármaco — afirma Vitório.